Bom dia! Gostaria de compartilhar outro artigo que escrevi e que diz muito com relação à linguagem, desta vez com a linguagem da alteridade, do respeito para com o diferente que encontramos na vida acadêmica. Infelizmente, este respeito não existe, o que redunda em consequências terríveis, tais como o massacre do Realengo (RJ) em 2011. Pensando neste tema, e, como TCC final, elaborei o seguinte trabalho:
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Uma das consequências do bullying é o fracasso escolar |
TÍTULO: BULLYING E FRACASSO ESCOLAR -
CARACTERISTICAS E INTERVENÇÕES
TITLE: BULLYING AND
SCHOOLING FAILURE – CHARACTERISTICS AND INTERVENTIONS
RESUMO
A
agressividade entre alunos, atualmente estudada como fenômeno bullying, é um mal que ocorre em instituições
educacionais do mundo todo. Não obstante ser um fenômeno antigo foi
negligenciado tanto no ambiente escolar, como no ambiente familiar, e vem
granjeando destaque ultimamente nas pesquisas educacionais. O objetivo deste
trabalho, entendido como Artigo Científico de Revisão Bibliográfica, foi identificar, analisar o que se tem
produzido cientificamente no concernente ao Bullying,
entendido como fenômeno de agressividade no ambiente escolar, associado ao
Fracasso Escolar. Pretendeu-se, ainda, ao estudá-lo em sua gênese, e em sua
tipologia, alertar educadores e pais para o tratamento e prevenção deste
fenômeno, que é um mal e que desencadeia sérios problemas no aprendizado dos
educandos, levando-os ao Fracasso Escolar. Assim, verificou-se a relevância do
tema, especialmente pelas suas consequências dramáticas e funestas, que apontam
para a necessária intervenção imediata de familiares e profissionais da
educação.
Palavras-chave:
Violência
escolar. Bullying. Fracasso Escolar.
ABSTRACT:
Agressivity, amongst students, is being studied as a
fenomenon known as bullying. It happens all over the schools of the world.
Notwithstanding is an old fenomenon, it was neglected as much inside the school
environment as in the families. It has been attracting spot-light lately on
educational researches. This paper, understood as a Scientific Article of
Bibliographical Review, objects to identify, analyse what has been
scientifically done concerning to Bullying, understood as a agressivity
fenomenon inside the school environment, associated with Schooling Failure. It
was still intended to study it in its early genesis, in its typology, to warn
Educators and parents to the right treatment and prevention of this fenomenon,
which is a wicked symptom of the present time and breaks out serious problems
on the students Learning, carrying them to
Schooling Failure.It is shown the fenomenon characterization, its consequences
for the players on the problem, the teachers and parents role in facing the
problem (bullying) and ways to cope with it in order to neutralize its
consequences into the school. In order to write this paper it was used, as data
resources, articles and texts located in libraries, scientific literature data
base and relevant internet pages.
Key-Words: School Violence. Bullying. Schooling Failure.
Introdução
Segundo Lopes Neto, em seu artigo "Bullying
- Comportamento Agressivo entre Estudantes" (2005), a violência é um
problema de saúde pública importante e crescente no mundo, com sérias
consequências individuais e sociais, particularmente entre jovens. Ora, o autor
procurou trabalhar o termo ‘violência escolar’ no que
diz respeito a todos os comportamentos agressivos e anti-sociais,
incluindo os conflitos interpessoais, danos ao patrimônio, atos
criminosos, etc. Muitas dessas situações dependem de fatores externos,
cujas intervenções podem estar além da competência e capacidade das entidades
de ensino e de seus funcionários. Porém, para um sem número delas, a
solução possível pode ser obtida no próprio ambiente escolar. O autor
define o termo bullying, como produto e materialização dessa violência escolar, e nos traz dados estatísticos da ABRAPIA (Associação
Brasileira Multiprofissional de Proteção à Infância e à Adolescência).
Outros
autores que foram mencionados no presente estudo são Menezes e Castelo Branco,
no trabalho acadêmico intitulado "Estudo do fenômeno do Bullying e
suas repercussões sócio-educacionais" (2008), no qual os autores analisaram
a agressividade como fator que ocorre nas instituições escolares de todo o
mundo e é tão antigo quanto a própria escola. Também definiram e delimitaram o
fenômeno bullying, dando exemplos de
casos que foram utilizados no presente trabalho, dando, também, as implicações sócio-educacionais tanto para
os praticantes como para os que sofrem o bullying.
Enfatizaram o papel da Educação enquanto agente coibidor de tal prática,
mediando, intercedendo em favor da vítima de bullying para debelar tal mal.
Nesse
contexto, objetivou-se fazer um estudo tomando por base a historicização do bullying, sendo certo que se estudaram
dois itens principais, devido à extensão do tema e pelo fato de se ter como
objetivo ater à sua ligação com o ambiente escolar, ou seja, quais as
características e intervenções que a Escola pode fazer para evitar que o Bullying seja fator de Fracasso Escolar:
a) histórico do bullying (características, termos,
aspectos psicológicos) e situação em outros países;
b) papel da Escola frente a esse
desafio – bullying. Os educadores
estão preparados para enfrentar esse problema? Qual a formação, base teórica
que eles recebem para contornar e vencer esse mal?
c) como prevenir o Fracasso
Escolar, sabendo que tal fenômeno pode e deve ser evitado a todo custo?
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A discriminação entre jovens é meio passo para um adulto que usa da assimetria do poder, querendo se impor a tudo e a todos. |
Este
estudo se justificou pelo fato de que se vive em uma sociedade violenta,
opressora, na qual o mais forte tanto fisica como economicamente prepondera,
achaca o semelhante, não respeitando o direito alheio de ser diferente, de ter
sua própria individualidade e personalidade. Ora, nesse contexto, escolheu-se o
tema que se desenvolve através do presente Artigo Científico de Revisão
Bibliográfica. Devido ao fato de o problema ser recente, pelo menos no que
tange ao afloramento e denúncia da sociedade quanto a isso, tal pesquisa se
justificou, na medida em que tentou desvendar e desvelar os meandros do mesmo,
ou seja, historicizar, situacionar dentro do contexto escolar tal, fato este
que não interessa à sociedade atual, que visa sempre o sucesso do aluno.
Assim
sendo, tal pesquisa foi de suma importância, pois ajudará educadores, e outros
interessados no saneamento do problema ora debatido a entendê-lo melhor para
extirpá-lo, ou, pelo menos, minimizá-lo de nossa sociedade.
Uma retrospectiva sobre o Fenômeno Bullying
O
fenômeno conhecido como bullying
sempre ocorreu no decorrer da História humana, todavia, foi somente em meados
do século passado (XX) que pesquisadores, estudiosos se debruçaram para tentar
deslindar esse fenômeno que tanto mal traz para a sociedade humana, tanto no aspecto
interpessoal como no familiar e escolar.
Afinal,
o que significa tal vocábulo? Pode-se dizer que sempre houve estudos sobre as
influências do ambiente escolar e dos sistemas educacionais sobre o desenvolvimento
acadêmico do jovem (LOPES NETO, 2005), todavia, o fenômeno bullying, que ocorre no ambiente escolar, foi estudado tão somente
a partir de 1990, visto que a agressividade nas escolas é um problema universal
que estava tomando proporções desmedidas e inaceitáveis no presente tempo.
Pode-se definir bullying como um fenômeno que compreende todas as atitudes
agressivas, intencionais e repetidas, que ocorrem sem motivação evidente,
adotadas por um ou mais estudante contra outro(s), causando dor e angústia,
sendo executadas dentro de uma relação desigual de poder (LOPES NETO, 2005). Na
verdade, o que ocorre é uma assimetria de
poder, no qual alguém mais forte tanto fisica como psicologicamente falando,
exerce violência contra outro.
Digno de nota é ressaltar que essa
assimetria é tradicionalmente admitida como natural, sendo habitualmente
ignorada ou não valorizada, tanto pelos professores quanto pelos pais (LOPES
NETO, 2005). Com tal assertiva pode-se aferir o quanto o fenômeno é pernicioso,
pois ele exerce seu caráter de maneira subreptícia, inoculando em seus agentes
a aceitabilidade, o caráter de normalidade,
não suscitando o contraditório, o questionamento e eliminação deste mal.
Não há dúvida de que a identificação
da violência escolar é um fato tão antigo quanto a própria escola. Ele advém
tanto da violência que se alastra como uma praga na sociedade e que, por sua
vez, acaba contaminando as instituições escolares sejam elas públicas ou
privadas, como também pode ser gerado por fatores internos, ou seja, nasce do
próprio ambiente pedagógico a partir da relação entre sujeitos (MENEZES,
CASTELO BRANCO, 2008).
O termo violência é muito abrangente,
pois contempla uma ampla gama de comportamentos como agressão, bullying, intimidação, ameaça, ofensa à
integridade, combate, roubo e vandalismo. Estas ações podem ocorrer dentro ou
fora das escolas, e entre diferentes díades, ou seja, aluno-aluno,
professor-aluno. Também o corpo administrativo escolar, ex-alunos e outras
pessoas que não pertencem à escola, podem ser envolvidos, quer como vítimas, ou
como agentes (CARVALHOSA, MOLEIRO & SALES, 2009).
O vocábulo bullying foi adotado universalmente em decorrência da dificuldade
em traduzi-lo para as diversas línguas. No transcorrer da Conferência
Internacional Online School Bullying and
Violence, de maio a junho de 2005, ficou caracterizado que o amplo conceito
dado à palavra bullying dificulta a
identificação de um termo nativo correspondente em países como Alemanha,
França, Espanha, Portugal e Brasil, entre outros (Visionary-net. School
Bullying and violence. 2005
may 4- jun 3. www.conference.bullying-in-school.info.
Acesso em 30.06.11).
Geralmente considerada como violência
no contexto escolar, um grande número de estudos teve como ponto de partida
para análise, a indisciplina, a agressão (COSTA & VALE, 1998 apud NEGREIROS, 2003), e o bullying. No presente trabalho, frise-se, centrou-se apenas no
fenômeno bullying.
As pesquisas sobre bullying são recentes e ganharam destaque a partir dos anos 1990,
principalmente com Olweus, 1993; Smith & Sharp, 1994; Ross, 1996; Rigby,
1996 (apud LOPES NETO, 2005). Segundo o autor, estudos indicaram que a
prevalência de estudantes vitimizados varia de 8 a 46%, e de agressores, de 5 a
30%.
De acordo com a definição proposta por Dan
Olweus, o bullying envolve intencionalidade do comportamento, a repetição ao
longo do tempo e o abuso de poder entre pares (alunos) (OLWEUS, 1993). As ações
negativas podem ser verbais, como, por exemplo, ridicularizar alguém; físicas,
como, por exemplo, bater em alguém, ou sociais, como, por exemplo, excluir
socialmente (CARVALHOSA, MOLEIRO & SALES, 2009).
Dentro do contexto escolar brasileiro,
a escola sempre foi vista como um local de aprendizado, avaliando-se o
desempenho dos alunos com base nas notas dos testes de conhecimento e no
cumprimento de tarefas acadêmicas. Entrementes, existem três (03) documentos
legais que formam a base de entendimento com relação ao desenvolvimento e
educação de crianças e adolescentes: a Constituição
da República Federativa do Brasil, o
Estatuto da Criança e do Adolescente e a Convenção sobre os Direitos da Criança da Organização das Nações Unidas.
Em todos esses diplomas legais se encontram previstos direitos ao respeito
e à dignidade, sendo a educação entendida como um meio de prover o pleno
desenvolvimento da pessoa e seu preparo para o exercício da cidadania (LOPES
NETO, 2005).
Dentro deste contexto, sempre se
desejou que as escolas fossem ambientes seguros e saudáveis, nos quais as
crianças e adolescentes pudessem desenvolver, ao máximo, os seus potenciais
intelectuais e sociais. Portanto, não se pode admitir que sofram violências que
lhes tragam danos físicos e/ou psicológicos, que testemunhem tais fatos e se
calem para que não sejam também agredidos e acabem por achá-los banais ou, pior
ainda, que diante da omissão e tolerância dos adultos, adotem comportamentos
agressivos.
Classificação
O bullying
é classificado como direto, quando as
vítimas são atacadas diretamente, ou indireto,
quando estão ausentes. São considerados bullying
direto os apelidos, agressões físicas, ameaças, roubos, ofensas verbais ou
expressões e gestos que geram mal estar aos alvos. São atos utilizados com uma
frequência quatro vezes maior entre os meninos. O bullying indireto
compreende atitudes de indiferença, isolamento, difamação e negação aos
desejos, sendo mais adotados pelas meninas (NETO AA; SAAVEDRA LH, 2004).
Com o advento de novas técnicas de
comunicação via teleinformática, uma nova forma de bullying tem sido observada com uma frequência cada vez maior no
mundo. Trata-se do uso da tecnologia de informação e comunicação (e-mails, telefones celulares, mensagens
por pagers ou celulares, fotos
digitais, sites pessoais
difamatórios, ações difamatórias online)
como recurso para a adoção de comportamentos deliberados, repetidos e hostis,
de um indivíduo ou grupo, que pretende causar danos a outros (SHROFF PENDLEY,
J.S. Bullying and your child. Disponível
em: <www.kidshealth.org.parent/emotions/bullies.html>. Acesso em 05.08.11) A vitimização
através de telefones celulares foi admitida por 14 a 23 % dos adolescentes
entrevistados em três pesquisas (Idem. Acesso em 05.08.11).
Fatores de Risco
O bullying
é mais prevalente entre alunos com idades compreendidas entre 11 e 13 anos,
sendo certo que a incidência é menor entre alunos na educação infantil e ensino
médio. Quanto ao gênero dos agressores, predomina o sexo masculino, enquanto
que no papel de vítima não há diferença entre os gêneros. O fato de predomínio
do sexo masculino entre os agressores, não significa que sejam mais agressivos,
mas tão-somente que têm maior possibilidade de adotar esse tipo de
comportamento. Todavia, quanto à dificuldade em identificar bullying entre meninas, indica que elas
se utilizam de formas mais sutis para praticá-lo.
Levando-se em conta que a maioria dos
atos de bullying são praticados longe
do campo de visão dos adultos, e que grande parte das vítimas não reage ou fala
sobre a agressão sofrida, pode-se entender por que professores e pais têm pouca
percepção do fenômeno, subestimam a sua prevalência e atuam de forma
insuficiente para sua redução e interrupção (ESLEA M.; REES J., 2001). A
ABRAPIA (Associação Brasileira Multiprofissional de Proteção à Infância e à
Adolescência) identificou que 51,8% dos autores de bullying admitiram não terem sido advertidos (NETO AA; SAAVEDRA
LH., 2004). A aparente aceitação dos adultos e a consequente sensação de
impunidade favorecem a perpetuação do comportamento agressivo.
Todavia, a redução dos fatores de risco
pode desempenhar um papel preventivo, no sentido de se prevenir o comportamento
agressivo entre crianças e adolescentes. O foco deve ser no sentido de envidar
todos os esforços para diminuir/eliminar a violência dentro do contexto
escolar, doméstico e comunitário, além daquele que a mídia enfoca e tem como
glamour (lutas marciais, filmes violentos, games de
guerra, etc).
Formas de envolvimento
dos estudantes
Tanto as crianças quanto os
adolescentes podem ser classificados, enquanto participantes do fenômeno bullying, como vítimas, agressores ou testemunhas
de acordo com sua atitude diante dessas situações de bullying. É impossível prever qual papel adotará cada aluno, uma
vez que pode ser alterado de acordo com as circunstâncias (DAWKINS, J., 1995).
A metodologia de classificação adotada
pela ABRAPIA prezou pelo cuidado em não rotular previamente os estudantes,
evitando que estes fossem estigmatizados pela comunidade escolar. Desta
maneira, adotaram-se os termos de bullying
(agressor), alvo de bullying (vítima), alvo/autor de bullying
(agressor/vítima) e testemunha de bullying (NETO AA, SAAVEDRA LH., 2004).
Alvos de bullying
Quais seriam os alunos alvos de bullying? Pode-se considerar aquele
aluno que é exposto, de forma repetida e durante certo tempo, às ações negativas
perpetradas por um ou mais alunos. Deve-se entender como ações negativas as
situações nas quais alguém, de forma intencional e repetida, causa dano, fere
ou incomoda outra pessoa.
Via de regra, eles não dispõem de
recursos, status ou habilidade para
contrapor ou cessar o bullying. Também
pode-se dizer que as vítimas deste fenômeno
são pouco sociáveis, inseguras e desesperançadas quanto à possibilidade
de adequação ao grupo ao qual pertençam. Sua já presente baixa auto-estima é
incrementada por críticas dos adultos acerca de sua vida ou comportamento,
dificultando a possibilidade de ajuda. Tem poucos amigos, é passivo, retraído,
infeliz e sofre com a vergonha, medo, depressão e ansiedade. De uma maneira
geral, sua auto-estima está tão comprometida que acredita que é merecedor
destes maus-tratos inflingidos pelos perpetradores do bulllying (NETO AA, SAAVEDRA LH. 2004).
Indiscutível que o tempo e a
regularidade das agressões contribuem fortemente para o agravamento dos
efeitos, que podem comprometer o desenvolvimento acadêmico, além de aumentar a
ansiedade, insegurança e o conceito negativo de si mesmo. A fim de se evitar
novas agressões, a vítima se excluiu do ambiente escolar e do convívio social, achando que, com isso, será poupada.
O papel desempenhado pela família,
embora não haja estudos precisos sobre métodos educativos familiares que
incitem o desenvolvimento do bullying, indicaram
que alguns deles são facilitadores, tais como: proteção excessiva, gerador de
dificuldades para encarar os desafios e para se defender; tratamento
infantilizado, causador de desenvolvimento psíquico e emocional aquém daquele
que é tido como aceitável pelo grupo; e o papel de “bode expiatório” da
família, no qual ele sofre críticas sistemáticas e é responsabilizado pelas
frustrações e traumas dos pais.
Em casos específicos nos quais houve
situações nas quais alunos armados invadiram as escolas e atiraram contra
colegas e professores, cerca de dois terços desses jovens eram vítimas de bullying, sendo certo que lançaram mão
de armas para combater o poder que os sucumbia e os subjulgava. As agressões
não tinham objetos e alvos específicos, o que se sugeria que havia um desejo
oculto de se “matar a Escola”, local onde, diuturnamente, todos presenciavam
seu sofrimento e nada faziam para protegê-los e impedir tal violência (NETO AA, SAAVEDRA LH. 2004).
De maneira geral, é pouco comum que a
vítima do fenômeno bullying se abra,
revelando, de maneira espontanea a violência sofrida, visto recear retaliações,
pois descrê nas atitudes favoráveis da escola ou por recear possíveis críticas.
Nas pesquisas conduzidas pela ABRAPIA, 41,6% dos alunos alvos admitiram não ter
falado a ninguém sobre essa violência. Entrementes, o silêncio somente é
interrompido quando as vítimas sentem que serão, efetivamente, ouvidas,
respeitadas e seu drama valorizado. Conscientizar crianças e adolescentes que
essa violência oculta e subrepticia é inaceitável e que não será tolerada
permite que o enfrentamento deste mal seja feito com mais firmeza, transparência
e liberdade.
Autores de bullying ou bullies
Quais seriam as condições familiares
adversas para o aparecimento e desenvolvimento da agresssividade nas crianças?
Segundo pesquisas, houve a identificação da desestruturação familiar, do
relacionamento afetivo pobre, do excesso de tolerância ou de permissividade e da
prática de maus-tratos físicos ou explosões emocionais como forma de afirmação
do poder dos pais como essas condições (NETO AA, SAAVEDRA LH., 2004).
Não se pode negar que fatores
individuais influem na adoção de comportamentos agressivos, tais como:
hiperatividade, impulsividade, distúrbios comportamentais, dificuldade de
atenção, baixa inteligência e desempenho escolar deficiente.
Via de regra, o autor do bullying é uma figura bastante popular
no meio escolar; existe uma tendência de se envolver em uma grande gama de
comportamentos anti-sociais; pode mostrar-se agressivo inclusive com os
adultos; é impulsivo; encara como qualidade essa agressividade; exibe opiniões
favoráveis sobre si mesmo, no que tange ao bullying,
é geralmente mais forte que seu alvo; sente um prazer e satisfação sádica
em dominar, controlar e causar danos e sofrimentos a outros. Tirando esse fato,
pode haver um “componente benefício” em sua conduta anti-social, como ganhos
sociais e materiais (University of
Colorado. Center of Study and Prevention of Violence – Institute of
Behavioral Science at University at Bouder. Blueprints for violence prevention Training
and technical assistance. Disponibilizado em: www.colorado.edu/cspv/blueprints/model/programs/BPP.html.
Acesso em 01.09.11).
São, para se dizer, menos satisfeitos
com a escolar e as respectivas famílias, mais propensos ao absenteísmo e à
evasão escolar e têm uma tendência maior para apresentarem comportamentos de
risco (consumir tabaco, álcool ou outras drogas, portar armas, brigar, etc). Frise-se
que as possibilidades são maiores em crianças ou adolescentes que adotam
atitudes anti-sociais antes da puberdade e por longo tempo (LD Online. Bullying
: Peer abuse in schools. Source: Preventing
Bullying – A manual for Schools and Communities US Department of Education 11/3/1998,
www.ldonlline.org/ld_indepth/socil_skills/preventing_bullying.html. Acesso em
01.09.11).
Também pode manter um pequeno grupo em
torno de si, através da força física e constrangimento, que atua como
coadjuvante, auxiliar em suas agressões ou é indicado para agredir o alvo.
Neste diapasão, o autor dilui, minimiza a responsabilidade por todos ou a
transfere para seus liderados. Esses coadjuvantes, identificados como
assistentes ou seguidores, raramente tomam a iniciativa da agressão, são
inseguros ou ansiosos e se submetem à liderança do autor de bullying ou para se proteger ou pelo
prazer de pertencer ao grupo dominante (PEARCE;
THOMPSON, 1998).
Testemunhas de bullying
Em sua grande maioria, os alunos não se
envolvem diretamente em atos de bullying,
e, via de regra, se calam por medo de ser a “próxima vítima”, visto não
terem parâmetro de como agir e por não acreditarem na eficácia da escola
enquanto ente que coíbe tal fenômeno. Essa atitude de silêncio pode ser
entendida pelos autores como afirmação de seu poder, o que ajuda a acobertar
tais atos, transmitindo uma falsa tranquilidade aos adultos (NETO AA, SAAVEDRA
LH, 2004).
Grande parte das testemunhas sente
simpatia pelos alvos, tende a não culpá-los pelo ocorrido, condena o
comportamento dos autores e deseja que os professores intervenham mais
efetivamente (MENESINI et al, 1998).
A maneira como agem enquanto
coadjuvantes ao fenômeno bullying permitiu
classificá-los como auxiliares (participam ativamente da agressão),
incentivadores (incitam e estimulam o autor), observadores (só observam ou se
afastam) ou defensores (protegem o alvo ou chamam um adulto para interromper a
agressão).
Um número expressivo de testemunhas é levado
a acreditar que o uso de comportamentos agressivos contra os colegas é a via
mais rápida para alcançarem a popularidade e o poder e, por isso, tornam-se
autores de bullying (LOPES NETO,
2005). Outros podem, ainda, revelar prejuízo no aprendizado; receiam ser
relacionados à figura do alvo, ao perder seu status e tornar-se alvos, também, ou aderem ao bullying por pressão de colegas (LD Online. Bullying: Peer abuse in schools. Source:
Preventing Bullying – A manual for Schools and Communities US Department
of Education11/3/1998. Disponível
em: www.ldonlline.org/ld_indepth/socil_skills/preventing_bullying.html. Acesso em 01.09.11).
Ocorre que, se as testemunhas
interferirem e tentarem cessar o bullying,
essas ações se efetivam na maioria dos casos. Daí, a importância em
incentivar o uso desse poder advindo do grupo, ao conscientizar os autores a se
sentirem sem o apoio social necessário (NETO AA, SAAVEDRA LH, 2004).
Alvos/autores de bullying
Cerca de 20% dos alunos autores também
se mostraram ser vítimas de bullying, sendo,
portanto, denominados de alvos/autores. A química combinativa baixa auto-estima
e atitudes agressivas e provocativas indicou que uma criança ou adolescente
tem, como razão para a prática de bullying,
prováveis alterações psicológicas, devendo, consequentemente, merecer uma
atenção especial. Podem, ainda, ser depressivos, inseguros e inoportunos,
procurar humilhar os colegas com o intuito de encobrir suas limitações. Pelo
fato de serem impopulares e pelo alto índice de rejeição entre seus colegas, e
por vezes, pela turma toda, eles se diferenciam dos alvos típicos. Também podem-se
destacar sintomas depressivos, pensamentos suicidas e distúrbios psiquiátricos
neste grupo (NETO AA, SAAVEDRA LH. 2004).
Consequências do bullying
Diante de tudo o que se expôs no corpus deste trabalho, pode-se afirmar
que alvos, autores e testemunhas enfrentam consequências físicas e emocionais
de curto e longo prazo (American Violence
Association. Comission for the prevention of youth violence. Youth
and violence. Disponível em: www.ama-assn.org/ama/upload/mm/386/fullreport.pdf
acesso em 02.09.11), as quais podem causar
dificuldades acadêmicas, sociais, emocionais e legais. Desnecessário afirmar
que as crianças e adolescentes não são acometidas de maneira uniforme, mas sim
existe uma relação direta com a frequência, duração e severidade dos atos de bullying (NETO AA, SAAVEDRA LH, 2004).
Quanto mais jovem a pessoa sofreu bullying,
mais propensa está a sofrer de depressão e baixa auto-estima quando
adultos. Analogamente, quanto mais jovem a criança apresentar agressividade,
maior será o risco de apresentar problemas associados a comportamentos
antissociais em adultos e à perda de oportunidades, assim como a instabilidade
em empregos, e em relacionamentos
afetivos que serão pobres, além de dura duração (Disponivel em: www.kidshealth.org.parent/emotions/bullies.html. Acesso em 05.08.11).
Inequívoco afirmar que, com o simples testemunho de atos de bullying, já é suficiente para causar
descontentamento com a escola e comprometer o desenvolvimento acadêmico e
social.
Devem-se mencionar, ainda, prejuízos financeiros e sociais que são
oriundos do bullying, pois atingem
também as famílias, escolas e a sociedade em geral. Crianças e adolescentes que
são atingidos pelo fenômeno quer sofram, quer pratiquem, podem vir a necessitar
de múltiplos serviços, tais como saúde
mental, Justiça da Infância e Adolescência, educação especial e programas
sociais.
Quanto ao comportamento dos
pais dos alunos-alvo, verificou-se que podem ocorrer a variação desde a
descrença ou indiferença até reações de ira, raiva e inconformismo contra si
próprios e contra a escola. O sentimento de impotência, culpa e incapacidade
para vencer o bullying na vida de
seus filhos passou a ser a principal preocupação de suas vidas, surgindo, deste
modo, sintomas depressivos e influenciando sua performance no trabalho e nas relações interpessoais. Já a negação
ou indiferença da comunidade escolar (professores, gestores de escolas) pode
gerar desestimulo e a sensação de que não existe, realmente, uma preocupação
pela segurança dos alunos (Anonyme
Foreldre. Av MOBBEOFRE. Dag Oulie Psychiatrist. Disponível em: www.afam.no/cgi/nyheter.pl?id=37&lang=1.
Acesso: 02.09.11).
No que tange à relação familiar, esta pode ser seriamente comprometida.
Isto porque a criança ou adolescente pode sentir-se traído, se perceber que os
pais põem em cheque seus relatos ou, ainda, quando suas ações não são
assertivas (American Academy of Child
& Adolescent Psychiatry. Bullying. AACAP facts for families no. 80; c.
2004. Disponível em: www.aacap.org/pubblications/factsfam/80htm.
Acesso em 02.09.11).
O
Papel da Educação e Intervenções
Atualmente, é indiscutível que a violência pode ser banida ou, ao menos,
ter seus efeitos minimizados, caso os seus condicionantes forem modificados.
Neste sentido, a educação embora sozinha não consiga dar conta desta tarefa,
terá, sim, um papel fundamental para extinção ou não reprodução deste mal.
A fim de construir uma sociedade onde não impere a violência, é imprescindível
que os órgãos competentes tenham um olhar mais acurado para o papel da
Educação, pelo fato de que é nele que deve iniciar
a construção de uma cultura de paz.
Lopes Neto (2005) afirma que existem vários exemplos bem sucedidos de
iniciativas contra a violência em diferentes lugares do mundo, que vão desde
programas de menor porte até políticas de abrangência nacional.
Não obstante tais exemplos, a ausência de referências tem dificultado a
educação dos jovens do século XXI. Quer-se dizer com isso que os pais estão
cada vez mais ausentes, e tem-se dado uma procuração em branco somente à escola
com a finalidade de educar as crianças. Neglicenciam, ainda, a educação
emocional de seus filhos e não estão acostumados a exercer o diálogo em casa. A
situação tem-se deteriorado, uma vez que muitas vezes a própria escola tem se
mostrado ineficiente ao trabalhar a afetividade dos alunos. Neste diapasão, os
estudantes acabam reproduzindo na escola a educação que receberam em casa (ou
ainda, a falta dela), em suas relações interpessoais, através da agressividade
(CHALITA, 2008).
Neste diapasão, a intervenção e prevenção do fenômeno bullying em uma determinada escola
dependerão, majoritariamente, da consciência da comunidade escolar sobre a
existência do fenômeno e principalmente da relevância das consequências geradas
pelo mesmo. Havendo o entendimento de que o bullying
existe em grau maior ou menor em suas mais diversas realidades, e que não depende da classe social ou rede de
ensino (particular ou pública) e que também ele é um fato gerador de outras
formas de violência, diríamos, matriz de outros males de uma comunidade
escolar, será fundamental para o sucesso ou insucesso no enfrentamento da
violência entre escolares. Em outras palavras, primeiramente deve-se ter o
conhecimento ou aceitação do fenômeno bullying
(FANTE, 2005).
Não se deve esquecer, ainda, que os educadores devem aprender a lidar
com suas emoções para, deste modo, se tornarem capacitados a trabalhar com as
emoções de seus alunos, abordando em suas aulas o tema transversal da
afetividade. Assim o fazendo, os profissionais de Educação aprenderão a
trabalhar com seus conflitos e com as variegadas formas de violência, em
especial com o fenômeno bullying (FANTE,
2005).
Neste contexto, é imprescindível que haja o desenvolvimento de ações
solidárias nas escolas, objetivando o resgate da cidadania, a tolerância, o
respeito ao próximo e a consciência e valorização das individualidades, quer
sejam de gênero ou comportamentais, além de promover um ambiente que favoreça a
melhora da auto-estima do indivíduo. Assim o fazendo, investindo na formação de
pessoas melhores, como consequência constrói-se uma sociedade melhor (CHALITA,
2008).
Ademais, as ações de combate ao bullying
são praticamente sem custos. Uma constante supervisão da escola por parte
da escola estimulará os educandos a participar, mostrando aos agressores que
estes não contam com o apoio do restante do grupo. Além disso, o tema pode ser
abordado, ainda, através de dramatizações, assim como podem ser criados grupos
de apoio às vítimas, para que sintam protegidas, consequentemente, auxiliando
na solução dos casos (LOPES NETO, 2005).
Não custa lembrar que todos os casos de bullying têm solução que deve ser encontrada entre os co-participantes
do processo ensino-aprendizagem diretos
ou indiretos. Por ser um fenômeno muito complexo, quase nunca essa solução
aparecerá num passe de mágica, ao acaso, de forma simples e rápida, sendo
necessário, deste modo, um trabalho contínuo e preventivo, que deve ser
inserido como um tema transversal nas diversas atividades escolares (LOPES
NETO, 2005).
Assim deve-se encorajar os alunos a participarem ativamente da
supervisão e intervenção dos atos de bullying,
pois o enfrentamento da situação pelas testemunhas demonstra aos autores
que eles não terão o apoio do grupo. Treinamentos através de técnicas de
dramatização podem ser úteis para que adquiram habilidade para lidar de
diferentes formas. Uma outra estratégia é a formação de grupos de apoio, que
protegem os alvos e auxiliam na solução das situações de bullying.
Diante do que se expôs, fica perfeitamente claro que dois erros
principais não podem ser cometidos. O primeiro é o de nunca subestimar o problema
como simples brincadeira de idade, o que possivelmente só irá agravar mais
ainda a situação. O segundo, é o equívoco de tratar isoladamente agressores e
vítimas, como geralmente acontece nas escolas.
Não obstante não haja uma fórmula pronta para o combate ao fenômeno bullying, é consenso entre os autores
estudados o fato de que jamais devem ser tomadas atitudes violentas. Se não se
pode indicar o caminho do sucesso nesta tarefa, ao menos é possível saber que
enfrentar o problema com mais violência, seguramente levará a resultados sem
êxito (LOPES NETO, 2005).
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Somente com uma cultura de PAZ conseguiremos vencer o bullying e seus efeitos nefastos na sociedade e na escola |
Conclusão
Não há dúvida de que a
violência, nos últimos anos, tem se desenvolvido e lançado seus tentáculos em
todos os aspectos sociais, em escala mundial, acarretando graves consequências
para a sociedade. Também não há dúvida de que esse tentáculo abarcou a escola,
e ela tem se mostrado fraca e incapaz de combater esse fenômeno de condutas
anti-sociais que ocorrem dentro de
seu seio. Vários tipos de violência ocorrem dentro do ambiente escolar, mas o
que se destaca, ultimamente, é a agressividade entre os educandos, mais
precisamente o fenômeno bullying.
O que chama atenção neste fenômeno é o
potencial que ele tem para gerar consequências drásticas e funestas ao
psiquismo do indivíduo, acarretando prejuízos de ordem emocional e
sócio-educacional, em especial relacionada ao fracasso escolar.
O fato de se desprezar ou minimizar o bullying como uma atitude de menor
relevância é o principal obstáculo para sua superação, indicando a necessidade
de se ter mais discussões e trabalhos desveladores a seu respeito, visando à
conscientização do mal, assim como alertar à comunidade escolar que ela nunca
deve continuar funcionando como mera reprodutora dessa forma de violência.
Neste contexto, a importância deste
trabalho foi o de ser voltado não somente para estudos acadêmicos, mas para a
sociedade como um todo, com o intuito de se alertar, ampliar os debates acerca
do fenômeno bullying na escola. .
As soluções para debelar e prevenir esse
mal não são das mais simples, visto que deve haver uma ação contínua e
interdisciplinar, partindo-se da parceria entre a família, a escola, assim como
os profissionais da área de saúde. Batalhando sob esse comando, será possível
construir um ambiente de paz e felicidade que é essencial para qualquer
indivíduo.
A construção de uma sociedade melhor
depende de diversos fatores que muitas vezes fogem da competência da Educação,
mas por outro lado, ela desempenha um papel essencial nesse jogo de
socialização do educando, a partir do resgate de valores tais como a
solidariedade, o respeito, a tolerância para como diferente, o amor, para,
deste modo, se criar laços entre os indivíduos, e que estão cada vez mais
frágeis. É inquestionável que a formação de seres humanos melhores é a pedra
basilar para a construção de um mundo melhor.
Referências
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