sábado, 26 de outubro de 2013

A PERCEPÇÃO DOS EDUCADORES DA EJA SOBRE AS DIFICULDADES DE APRENDIZAGEM DE SEUS EDUCANDOS NA APRENDIZAGEM DA LÍNGUA MATERNA SOB A ÓPTICA DA EDUCAÇÃO SOCIOCOMUNITÁRIA










Tivemos  outro trabalho submetido à XIII Mostra de Produção Científica e V Mostra de Responsabilidade Social que, neste ano, ocorrerá na Unisal de Lorena/SP, aprovado. Foi com grata satisfação que recebemos esta notícia. Tanto eu, Prof. Tadeu Giatti, quanto as professoras Keila Mourana e Sônia Ferrari apresentaremos, sob a forma de pôster, um trabalho intitulado A PERCEPÇÃO DOS EDUCADORES DA EJA SOBRE AS DIFICULDADES DE APRENDIZAGEM DE SEUS EDUCANDOS NA
APRENDIZAGEM DA LÍNGUA MATERNA SOB A ÓPTICA DA EDUCAÇÃO SOCIOCOMUNITÁRIA. Ressaltaremos o aspecto da alteridade no trato da Língua Materna, tendo como atores os Educadores da EJA (EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS) e os educandos. Abaixo um resumo dos orientadores e eixo formador do trabalho:

Eixo: Formação de Educadores para o século XXI
A PERCEPÇÃO DOS EDUCADORES DA EJA SOBRE AS DIFICULDADES DE APRENDIZAGEM DE SEUS EDUCANDOS NA
APRENDIZAGEM DA LÍNGUA MATERNA SOB A ÓPTICA DA EDUCAÇÃO SOCIOCOMUNITÁRIA
ORIENTADOR: SUELI MARIA PESSAGNO CARO
ORIENTADOR: VALÉRIA OLIVEIRA DE VASCONCELOS
ORIENTADOR: SEVERINO ANTÔNIO MOREIRA BARBOSA
EXPOSITOR PRINCIPAL: TADEU DE JESUS GIATTI
EXPOSITOR: SONIA MARIA SOUZA FERRARI
EXPOSITOR: KEILA MOURANA MARQUES SILVA


link: http://www.lo.unisal.br/sistemas/mostra2013/aprovados.aspx

quinta-feira, 24 de outubro de 2013

Projeto Orosimbo Maia

A escola estadual Orosimbo Maia está repleta de História. Vejam esta foto datada de 1956 que mostra um pôster de professores da época que eram os profissionais efetivos na época. Percebe-se o respeito que tinha pelos docentes, com a fixação de seus nomes em um mural. Seguramente nossos profissionais atuais merecem tal respeito!



quarta-feira, 23 de outubro de 2013

ALUNOS DA EE OROSIMBO MAIA NA UNICAMP

Tivemos a grata satisfação de saber que alunos oriundos do Ensino Médio de nossa escola, após terem feito o cursinho PROFIS na Unicamp, foram aceitos para continuar seus estudos no ensino superior, sendo que uma cursará Medicina e outro Engenharia. Foram nossos alunos e também frequentaram nosso espaço da biblioteca. Sentimo-nos satisfeitos em ter conseguido trabalhar conceitos tais como: a conscientização do falar em linguajar aceito como culto e o falar coloquial, a diferença da oralidade e da escrita, todos eles dentro do contexto dos livros. Mais uma prova de que estamos no caminho correto de nosso Projeto.


Projeto Biblioteca EE Orosimbo Maia

Desde Fevereiro de 2012, está implantado o projeto BIBLIOTECA da EE Orosimbo Maia, projeto este capitaneado pela equipe gestora da escola, tendo como executor e idealizador quem escreve este blog. Foi e continua sendo um projeto desafiador. Desafiador porque atrair jovens para o campo da leitura e escrita, sabendo usar a língua falada e escrita de maneira adequada é muito difícil nos dias atuais, tendo como rival a internet que, apesar de ser de grande utilidade, galvaniza toda força para o imediato, para o instantâneo, sem um esforço de se pensar e refletir sobre o que se lê e produzir textos significativos. No início o projeto não contou com grande número de participantes, visto que tínhamos que convencê-los dos benefícios da leitura. Tivemos que fazer uma peregrinação sala a sala de aula, convidando os alunos para irem ao espaço físico privilegiado da escola - Biblioteca - e conhecerem in locu este local de troca de saberes. Em um segundo momento, as parcerias firmadas com outros professores para serem protagonistas deste projeto, também, surtiu efeito. Motivando os alunos a lerem, incitando-os a despertarem a curiosidade e inteligência, obtivemos resultados excelentes, no segundo ano do projeto. No primeiro ano, tivemos 40 alunos que frequentaram este espaço, já agora, até outubro/13, este número subiu para 150 alunos. Todavia, não somente o aspecto quantitativo nos interessa, mas também o aspecto qualitativo. Alunos, cujos nomes divulgaremos futuramente, que tinham um desempenho pifio na leitura e escrita, conseguiram suplantar este problema, através da leitura. Depoimentos de diversos professores reforçam e nos incentivam a continuar nesta caminhada, pois as competências e habilidades na intelecção de textos de disciplinas da área de ciências exatas melhoram bastante. Em suma, tudo isto nos leva a continuar a trilhar neste caminho de construção comum de conhecimento com os alunos cujas fotos abaixo disponibilizo.

Alunos que frequentam constantemente nosso espaço da Biblioteca

Nossa biblioteca não é grande mas motiva e MUITO os alunos
a frequentá-la

Estes alunos são os que mais frequentam nosso espaço

sábado, 19 de outubro de 2013



Um vídeo deste Seminário talvez possa traduzir sua importância na formação e fomentação da educação sociocomunitária com crianças acolhidas pelo PAS (Programa de assistência Social).



APRESENTO UMA GALERIA DE FOTOS DO II SEMINÁRIO DE EXTENSÃO DO UNISAL EM AMERICANA/SP REALIZADO NO DIA 19.10.13



Programação

Data: 19 de Outubro de 2013

Tema: Juventude e Compromisso Social: a construção e efetivação dos Direitos Humanos.

Participantes:
  • UNISAL/Americana (Dom Bosco e Maria Auxiliadora)
  • UNISAL/Campinas (São José e Liceu Salesiano)
  • UNISAL/Lorena
  • UNISAL/São Paulo (Pio XI e Santa Teresinha)
  • Faculdade Dom Bosco de Piracicaba
  • IES convidadas.
08h30 - Credenciamento.
09h45 - Abertura e apresentação das IES
              Atividade cultural – Casa de Dom Bosco
10h15 - Mesa temática: Juventude e Compromisso Social: a construção e efetivação dos Direitos Humanos.
P. Agnaldo Soares LimaProf. Thiago Fernando Cardoso Nalesso
Coordenador da Mesa: Prof. Fabio Camilo Biscalchin
11h30 – Apresentação dos Pôsteres
Relação de Poster por corredor
12h30 às 13h30 - Almoço – com Atividades Culturais
14h - Apresentação de trabalhos – Comunicação Oral
Relação de Trabalho por Salas
15h45 - Encerramento.
- See more at: http://unisal.br/hotsite/seminarioextensao/programacao/#sthash.VvxxujO4.dpuf





























sexta-feira, 18 de outubro de 2013


Disponibilizo este texto de meu Orientador, Prof. Dr. Severino Antonio Barbosa sobre a necessidade imprescindível da leitura em suas várias acepções - literária, poética no mundo atual.

A educação e a crise da leitura: uma escuta poética
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The Education and the Reading crisis: a poetic listening
Recebido em: 4 de outubro de 2011
Aprovado em: 22 de dezembro de 2011
Severino Antônio
Professor do Programa de Mestrado em Educação do Centro Universitário Salesiano de
São Paulo. Doutor em Educação pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).
E-mail: severinoantonioeduc@uol.com.br
Resumo
Este artigo faz considerações sobre educação e linguagem, principalmente a linguagem
verbal e sua dimensão de poesia, questionando a crise de leitura em nossa sociedade, em
especial a leitura literária e poética. Faz proposta de re-ligação da leitura com a vida,
como  criação  e  recriação  de  sentido.  O  texto  também  apresenta  sugestões  de
experiências criativas para despertar o gosto de ler e para educar a inteligência e a
sensibilidade do leitor.
Palavras-chave: educação; linguagem; leitura; poesia.
Abstract
This article raises questions about education and language, particularly on the verbal
language  and  its  poetry  dimension,  discussing  the  reading  crisis  in  our  society,
especially the literary and poetic reading. It does yet the proposition to rebind the
reading act with life, as creation and recreation of meaning. The text also presents
suggestions of creative experiences to incite the joy of reading and to educate the
intelligence and sensibility of the reader.
Key-words: education, language, reading, poetry.
Ler o que nunca foi escrito.
Tal leitura é a mais antiga, anterior a toda língua – a
leitura das vísceras, das estrelas, ou das danças. Mais
tarde se constituíram anéis intermediários de uma nova
leitura, runas e hieróglifos.
É possível perceber o mundo como livro, e perceber esse
livro não somente como criptograma a ser decifrado, o
que supõe a inalterabilidade dosconteúdos, mas como
texto a ser escrito – uma escrita que é no fundo uma
reescrita, um reencontro que supõe a ação histórica do
homem.
Walter Benjamin
103
Este texto foi desenvolvido para a palestra proferida no Congresso Brasileiro de Escritores, da UBE
(União Brasileira de Escritores) , novembro de 2011
A poesia, que faz parte da literatura e, ao mesmo tempo,
é mais que a literatura, leva-nos à dimensão poética da
existência humana.
Revela que habitamos a Terra não só
prosaicamente – sujeitos à utilidade e à funcionalidade –, mas também
poeticamente, destinados ao
deslumbramento,
ao amor, ao êxtase.
Edgar Morin
A literatura é a Terra Prometida em que a
linguagem se torna aquilo que na verdade deveria ser.
Ítalo Calvino
Foi mais a ausência de poesia que tornou Auschwitz
possível. Diante da falta de sentido, que gera grande
desesperança, o poeta, por meio do sentimento poético,
poderá persuadir os homens a viver em novo céu e em
nova terra.
Yves Bonnefoy
Será uma quimera pensar numa sociedade que reconcilie
o poema e o ato, que seja palavra viva e palavra vivida,
criação de comunidade e comunidade criadora?
Octávio Paz
Introdução
Constelarmente, as epígrafes falam umas com as outras e com o texto em vir a
ser. Anunciam as questões que movem esta conversa – no sentido etimológico de conversar, dar voltas com os outros– em torno do tema da crise da leitura, principalmente
da leitura literária.
Neste diálogo, fazemos algumas considerações sobre a necessidade de despertar
o desejo de ler – como criação de sentido, em religação com a vida. Em especial,
considerações sobre a necessária redescoberta da poesia – raiz da linguagem, utopia da
palavra  –  como  educação  da  sensibilidade,  da  inteligência,  da  imaginação.  A
convivência com a poesia revela-se também redescoberta da dimensão poética de nossas
vidas.
A necessidade da poesia
Vida toda linguagem
Mário Faustino
A poesia é conhecimento, salvação, poder, abandono.
Operação capaz de transformar o mundo, a atividade poética é revolucionária
por natureza; exercício espiritual, é um método de libertação interior.
A poesia revela este mundo; cria outro.
Octavio Paz
Como  a  filosofia  para  Merleau-Ponty,  a  experiência  poética  revela-se  um
reaprender a ver. Também nos aproxima dos sentidos nascentes, do nascimento do
mundo para o homem e do nascimento do homem para o mundo, que não se separam da
origem e do destino das palavras.
A experiência poética traz iluminações sobre a natureza da linguagem. Leva-nos
a recordar que as palavras são uma das características diferenciadoras de nossa espécie,
e que elas têm múltiplas dimensões, para além da função de transmitir informações. As
palavras nomeiam o mundo. Nomear é ato de descoberta e criação de sentido. Muito
mais  do  que  um  rótulo,  os  nomes  são  desígnios,  e,  desse  modo,  elaboração  de
conhecimento.
Como  representação  simbólica,  as  palavras  tornam  presente  o  ausente,
possibilitando o pensar e exprimir as coisas e a nós mesmos. São também diálogo,
interlocução em que os sujeitos se constituem, e se reconhecem uns aos outros, uns nos
outros. Representam forma de ação e interação, dos sujeitos entre si, e deles com a
realidade.
Além  disso,  as  palavras  são  formas  de  criação.  Produzidas  social  e
historicamente, também produzem a sociedade e a história. São, ao mesmo tempo,
produto  da  cultura  e  produção  da  cultura.  A  dimensão  criadora  se  revela  mais
visivelmente na literatura, de modo singular na poesia, que é o campo mais concentrado
de sentido, de sentidos, símbolos que geram símbolos.
Dentre inúmeras vozes que reconhecem a necessidade da poesia e da literatura e,
assim,  a  necessária  leitura  poética  e  literária,  escolho  mais  algumas,  em  breve
constelação. No século XIX, em  A defesa da poesia, uma poética fundamental do
Romantismo e do mundo moderno, Percy Shelley faz considerações sobre a função vital
da poesia:  música planetária para ouvidos mortais, a poesia transforma tudo o que
toca, sua secreta alquimia transmuta em ouro potável as águas letais que escorrem da
morte para a vida.Em um ensaio sobre Brecht, na obra Homens em tempos sombrios,
Hannah Arendt conceitua o fazer poético: “a tarefa do poeta é cunhar as palavras pelas
quais vivemos.” (1987, p.212).
Octavio Paz, em  O arco e a lira,  faz uma síntese conceitual, com linguagem
poética:
A palavra é um símbolo que emite símbolos.
O homem é homem graças à linguagem, graças à
metáfora original  que o fez  ser outro e o separou do
mundo natural. O homem é um ser que se criou ao criar
uma linguagem. Pela palavra, o homem é uma metáfora
de si mesmo. (1985, p. 41-42)
Ivonne  Bordelois,  em  A  palavra  ameaçada,  discorre  poeticamente  sobre  a
convivência com a linguagem e a poesia:
Cada vez que abrimos espaços para a reflexão sobre o
sentido escondido das palavras ou para a ponderação da
sábia arquitetura da sintaxe, cada vez que celebramos a
graça  de  uma  piada  verbal  ou  de  uma  adivinha,  uma
estrofe, uma frase ouvida por aí, cada vez que incorremos
no  luxo  desse  passeio  arqueológico  entre  as  ruínas
maravilhosas que é a etimologia, estamos revivendo a
felicidade da linguagem e a possibilidade da poesia, que é
a  criatura  mais  excelsa  da  linguagem,  sua  coroa  de
estrelas. (2005, p.26).
Mais  que  milenarmente,  os  poemas  têm-nos  chamado  à  leitura  e  à  escuta
poética, assim como ao canto e ao corpo que dança. Este é um dos trabalhos que a
literatura realiza para humanidade, trabalho simbólico, criador de cultura.
Em tempos de crise – de sociedade, de cultura, de civilização – a convivência
com os poemas é ainda mais necessária.
Este é um dos poemas que escolhi para compor a obra O visível e o invisível:
A NECESSIDADE DA POESIA
I. o amor está escasso
nestes dias.
o cerco das misérias quase desnatura
as formas novas.
muitas mãos
ainda não se reconhecem.
II. a cota de sonhos em nossa boca
anda quieta.
entre os dentes e o céu
pouco se move a língua.
o ar se oculta
abaixo da garganta.
mas os nascimentos precisam de palavras.
os que nascem, precisam de poemas.
(2008, p. 61)
A perda da poesia e da palavra
As grandes obras de arte e as construções filosóficas
permanecem incompreendidas não por sua distância
grande demais do âmago da experiência humana,
mas pela razão contrária.
Adorno
O desprezo que cerca os melhores poetas é o mesmo
desprezo que cerca e impede a escuta profunda da
linguagem: de fato, esse desprezo não julga os poetas,
mas confirma e condena a surdez e a mediocridade
de sua época.
Ivonne Bordelois
Apesar de a poesia ser vitalmente necessária para a humanização da história, a
leitura  de  poemas  tem  sido  abandonada.  Na  chamada  “era  da  informação”,  da
“sociedade do conhecimento”, a poesia tem sido cada vez mais exilada – pelos poderes
do mercado, pelas lógicas do entretenimento e do consumo descartável, assim como
pelas maquinarias de seduções de propaganda e marketing.
A  indiferença  com  relação  ao  texto  poético  está  relacionada  com  a
desconsideração da literatura, das artes, da filosofia, não reconhecidas como forma
legítima e fecunda de conhecimento.
O  desprezo  pela  poesia  –  simultâneo  à  espoliação  dos  processos  poéticos,
instrumentalizados  nos  textos  publicitários  –  expõe  claramente  a  supremacia  do
conhecimento  técno-científico  e  seu  uso  instrumental,  utilitário  e  acumulador  de
poderes.
Boaventura de Souza Santos faz uma página síntese sobre esse silenciamento,
imposto também à sabedoria prática, à arte de viver e conviver, silenciamento que é
uma das causas da perda de sentido em nosso tempo:
Depois de três séculos de prodigioso desenvolvimento
científico,  torna-se  intoleravelmente  alienante
concluir com Wittgenstein, (...) que a acumulação de
tanto conhecimento sobre o mundo se tenha traduzido
em  tão  pouca  sabedoria  do  mundo,  do  homem
consigo próprio, com os outros, com a natureza. Tal
fato, vê-se agora, deveu-se à hegemonia incondicional
do saber científico e à conseqüente marginalização de
outros  saberes  vigentes  na  sociedade,  tais  como  o
saber religioso, artístico, literário, mítico, poético e
político,  que  em  épocas  anteriores  tinham  em
conjunto sido responsáveis pela sabedoria prática (a
phronesis), ainda que restrita a camadas privilegiadas
da sociedade. A vocação técnica e instrumental do
conhecimento  científico  tornou  possível  a
sobrevivência  do  homem  a  um  nível  nunca  antes
atingido (apesar de a promessa inicial ter ficado muito
aquém  da  promessa  técnica),  mas,  porque
concretizada sem a contribuição de  outros saberes,
aprendemos  a  sobreviver  no  mesmo  processo  e
medida  em  que  deixamos  de  saber  viver.  Um
conhecimento  anônimo  reduziu  a  práxis  à  técnica.
(2003, pág. 147-148).
Essas palavras recomeçadamente relembram o discurso de José Saramago, ao
receber o prêmio Nobel de Literatura, em 1998:
As  injustiças  multiplicam-se,  as  desigualdades  agravam-se,  a
ignorância  cresce,  a  miséria  alastra.  A  mesma  esquizofrênica
humanidade capaz de enviar instrumentos a um planeta para estudar a
composição das suas rochas assiste indiferente à morte de milhões de
pessoas pela fome. Chega-se mais facilmente a Marte do que ao nosso
próprio semelhante.(SARAMAGO, 1998, s/p).
No final do século XX e nesta primeira década do XXI, a supremacia da técnica
instrumentalizada pelo mercado acentua-se cada vez mais. A desfiguração do humano
assinala-se intensamente na perda da palavra – própria, expressiva, criadora.
Temos falado por slogans, pensado por jargões, imaginado por estereótipos.
Pouco ouvimos nossa própria voz e a voz dos outros.
Nestes dias cada vez mais vertiginosos e fragmentários, somos inundados pelas
últimas novidades e últimas informações – coisas, signos, imagens – quase sempre
confusas, desconexas, sem contextos e sem significação, multiplicadas pelas mídias
ubíquas que não cessam.
Em meados dos anos 80 do século passado, Ítalo Calvino escrevia:
Às vezes me parece que uma epidemia pestilenta tenha
atingido  a  humanidade  inteira  em  sua  faculdade  mais
característica, ou seja, o uso da palavra, consistindo essa
peste da linguagem numa perda de força cognoscitiva e
de imediaticidade, como um automatismo que tendesse a
nivelar  a  expressão  em  fórmulas  mais  genéricas,
anônimas, abstratas, a diluir os significados, a embotar
os  pontos  expressivos,  a  extinguir  toda  centelha  que
crepite  no  encontro  das  palavras  com  novas
circunstâncias.  Não  me  interessa  aqui  indagar  se  as
origens  dessa  epidemia  devam  ser  pesquisadas  na
política, na ideologia, na uniformidade burocrática, na
homogeneização  dos  mass-media ou  na  difusão
acadêmica de uma cultura média. O que me interessa são
as  possibilidades  de  salvação.  A  literatura  (e  talvez
somente a literatura) pode criar os anticorpos que coíbam
a expansão desse flagelo lingüístico.
Gostaria de acrescentar não ser apenas a linguagem que
parece  atingida  por  essa  pestilência. As  imagens,  por
exemplo,  também  o  foram.  Vivemos  sob  uma  chuva
ininterrupta de imagens; os  media  todo-poderosos não
fazem  outra  coisa  senão  transformar  o  mundo  em
imagens, multiplicando-o numa fantasmagoria de jogos
de  espelhos  –  imagens  que  em  grande  parte  são
destituídas  da  necessidade  interna  que  deveria
caracterizar  toda  imagem,  como  forma  e  como
significado,  como  força  de  impor-se  à  atenção,  como
riqueza  de  significados  possíveis.  Grande  parte  dessa
nuvem de imagens se dissolve imediatamente como os
sonhos que não deixam traços na memória; o que não se
dissolve é uma sensação de estranheza e mal estar.
Mas  talvez  a  inconsistência  não  esteja  somente  na
linguagem  e  nas  imagens:  está  no  próprio  mundo.  O
vírus ataca a vida das pessoas e a história das nações
torna todas as histórias informes, fortuitas, confusas, sem
princípio nem fim. Meu mal estar advém da perda de
forma que constato na vida, à qual procuro opor a única
defesa  que  consigo  imaginar:  uma  idéia  de  literatura.
(1990, p.72-73).
Nestas décadas que nos separam do texto de Calvino, a crise de perda de sentido
tem  se  agravado  e  aprofundado  em  todos  os  campos  da  cultura  e  da  existência.
Precisamos de renascimentos.
A crise da leitura
As coisas se desfazem,
o centro já não se sustém.
William B. Yeats
A crise da poesia e da palavra é também crise da leitura.
O exílio poético, a peste que desfigura a linguagem, a carência da arte de viver e
conviver, a perda das palavras, o abandono da leitura não são questões relativas apenas
ao grande mundo, ao macro-cosmos do tempo em que vivemos. Essas questões estão
presentes  na  história  de  cada  dia,  de  cada  sujeito.  De  um  modo  mais  claro,
presentificam-se no cotidiano de quem trabalha com as palavras. Assim, um dos campos
que mais explicita a crise é a sala de aula.
Em quarenta anos de trabalho com leitura e redação, e nas constantes conversas
com professores de diferentes partes do país, nunca encontrei tanta perda de sentido
como em nossos dias.
O leitor de olhos livres, que faz leitura criadora, em diálogo com o texto, tem
sido cada vez mais raro. Assim como – no ato de ler e para além dele – é raro o gosto de
pensar pela própria cabeça e falar pela própria boca, assim como é rara a alegria de
aprender, por paixão do conhecimento, na travessia com os livros e para além deles. Os
sinais de desinteresse e desencanto estão em toda parte.
De modo semelhante, no ato de escrever raramente se encontra um texto escrito
com alegria de pensar, alegria de dizer, um texto com rosto, com singularidade, com
sinais de autoria de palavras e de pensamento.
A convivência com a criação poética, a leitura de poemas, é um grande antídoto
para a crise de linguagem, de leitura, de escrita, mas a poesia nunca foi tão ignorada.
Existe a argumentação de que em nenhuma outra época se leu e escreveu tanto,
como  hoje.  Argumentam  que  milhões  de  mensagens  de  texto  são  trocadas
cotidianamente, a todo instante, principalmente pelos jovens. No entanto, é preciso
perguntar: o que está sendo escrito e lido? Como tem sido a escrita e a leitura? Na
maioria das vezes, trata-se de mensagens consumíveis, esquecidas em segundos, em
meio a muitas outras, igualmente descartáveis. À banalização se segue a indiferença.
Essa dispersão se agrava com outra marca do nosso tempo: a avalanche de informações
a que estamos submetidos todos os dias.
Saturados  de  estímulos  e  solicitações,  sob  poderosas  forças  centrífugas  de
dispersão, vamos ficando ao mesmo tempo excitados e entediados.
Por um lado, abrem-se novas possibilidade de conexão, de convivência com a
multiplicidade  de  referências.  Por  outro  lado,  e  ainda  mais,  multiplicam-se  novos
processos de desagregação, perda reflexiva e confusão.
Uma  questão:  que  quadro  sinóptico  poderia  representar  essas  leituras
superficiais,  fragmentadas,  corridas,  dispersivas?  Nelas  não  há  arborização,  nem
rizomas.  Demasiadamente  descontínuas,  elas  se  enveredam  por  ligações  quase
aleatórias, por laços metonímicos com um elemento de outros textos. Muitas vezes essas
leituras se dispersam e não retornam à questão principal, ao tema motivador, ao fluxo do
raciocínio, à tessitura das imagens e dos sentidos. Não raro, elas se esquecem de si
mesmas, do seu próprio motivo de sua realização.
Uma ressalva: ler de modo descontínuo, nômade, passeando com os olhos, em
enumeração  livre  –  e  até  mesmo  caótica  –  pode  ser  um  processo  criativo,  como
momento  de  um  processo  de  criação,  com  algum  grau  de  consciência  ou
intencionalidade. No entanto, se feita de modo irrefletido e indiferente, essa leitura
tende a tornar-se dispersão, ruído e insignificação.
Assim, nas leituras e nas redações escolares tenho constatado que é cada
vez maior a dificuldade de o aluno se concentrar mais profundamente em uma questão,
de modo não apressado nem superficial. Também se evidenciam outras dificuldades,
como  a  de  estabelecer  ou  reconhecer  conexões  sintáticas  mais  elaboradas,  e  a  de
compreender ou arquitetar raciocínios mais complexos. A teia de interações e o tecido
de interdependências, que caracterizam tanto a linguagem como a realidade, vão se
tornando inacessíveis.
Principalmente no campo semântico, cada vez é mais evidente a dificuldade de
interpretar  ou  construir  textos  simbólicos,  em  que  é  necessário  ler  e  pensar  nas
entrelinhas. Etimologicamente, inteligência é  inte-legere: ler dentre as linhas. Legere,
por  sua  vez,  vem  de  recolher,  originariamente  recolher  frutas  e  frutos. A  recolha
pressupõe percepção, análise, seleção, inter-relação, formação de conjuntos. O exercício
de ler, dessa maneira, é um processo de educação da inteligência, assim como da
sensibilidade. A crise da leitura – do mundo e dos textos – é também crise da capacidade
de pensar e de sentir.
Estes são alguns sinais de que se aprofunda e se expande a crise de perda de
sentido, com as palavras, com a leitura, com a existência. Muitos sinais de desencanto.
Em outro texto, Uma nova escuta poética da educação e do conhecimento, ao
escrever sobre a necessidade de poetizar o pedagógico, faço algumas considerações que
tem ressonâncias:
A perda do poético desnuda a perda de sentido, em todos
os campos da existência.
A solidão, e o desenraizamento: já não sentimos o nosso
pertencimento  a  uma  família,  uma  comunidade,  uma
classe  social,  um  povo.  Nem  nosso  pertencimento  à
humanidade, à Terra, ao Cosmos.
A  desfiguração,  e  as  dilacerações:  sem  voz  própria,
partidos, perdemos a imagem do mundo e a nossa própria
imagem;  esquecemos  nossa  história,  quem  realmente
somos, o que genuinamente desejamos, o que precisamos
vir-a-ser.
Errantes em nós mesmos e no mundo errante, precisamos
de  renascimentos.  Precisamos  de  recriação  poética.
(2009, p.121).
A redescoberta da palavra poética
Não existe nada morto
de uma maneira absoluta:
cada sentido terá sua festa de ressurreição.
Problema do grande tempo.
Bakhtin
E, sempre e antes de tudo, nos aproximarmos da poesia
como a zona mais alta e misteriosa da linguagem,
a comprovação mais certeira de sua força mágica
e dos mundos de energia e liberdade
que através dela nos habitam.
Ivonne Bordelois
Cada poema é um campo de produção de sentido, um campo de possíveis, um
mundo de imagens, ritmos, emoções, idéias, nunca um objeto de consumo. Não se reduz
à  mercadoria,  não  tem  finalidade  utilitária  imediata.  O  poema  faz  sentir,  pensar,
imaginar, viver. Isso não pode ser vendido, nem comprado. Esta é uma das razões do
exílio: sua recusa da lógica do entretenimento e do consumismo. Outras razões vêm do
próprio mundo da criação de literatura, de concepções que reduzem o poema a apenas
uma de suas dimensões, como por exemplo a sua dimensão empírica de sonoridade,
com decomposição de palavras, trocadilhos, parônimos, com o abandono da teia de
interações sintáticas e semânticas. Outras razões, ainda, vêm de análises que desnaturam
a linguagem e sua dimensão poética, tratando o texto mecanicamente.
O poema não pode ser tratado de modo instrumental, reduzido a procedimentos
técnicos,  de  fabricação  literária,  seja  de  fórmulas  beletristas  ou  de  modismos
modernistas. Também não pode ser tratado como um corpo morto, a ser autopsiado.
Além disso, é necessário fazer a religação do que não pode ser separado, o som e o
sentido,  assim  como  não  pode  ser  dissociado  o  cognitivo  do  sensitivo,  nem  estes
dissociados das imagens e dos ritmos. A cisão da unidade concreta do poema desfigura
as palavras e sua natureza poética.
Em meados do século XX e nas duas décadas seguintes, circulava muito a idéia
de que a obra de arte falava apenas de si mesma, remetia-se apenas a si mesma.
Muitas  vezes,  essa  concepção  estava  relacionada  com  a  idéia  de  que  o
significado de uma palavra é apenas outra palavra. A essa espécie de autismo das obras
e a esses jogos de espelho da linguagem, sem conexão com a vida, a cultura, a história,
acrescentava-se também a tese, muito comum em vários grupos de vanguarda, de que
“só o incomunicável comunica”: a medida de valor de uma obra era apenas a sua
novidade em termos formais, com o desprezo do campo dos sentidos, o que levou
muitos artistas e movimentos a uma luta incessante de todos contra todos, cada um se
pretendendo  o  proprietário  da  última  novidade  do  mercado  da  criação  e,  assim,
figurando como a última – e única – possibilidade criativa, com o silenciamento de
todas as outras vozes. Com isso, não raro os textos passaram a ser lidos somente por
especialistas, reduzindo dramaticamente a abrangência da leitura e o continente dos
leitores.
Todorov,  que  era  um  dos  principais  pensadores  do  Formalismo  e  do
Estruturalismo, a partir dos anos 80, tem repensado a literatura e a linguagem, em várias
obras. Em A literatura em perigo, faz considerações vitais para nosso tempo de crise da
leitura e de necessidade de renascimento:
Hoje, se me pergunto por que amo a literatura, a resposta
que me vem espontaneamente à cabeça é: porque ela me
ajuda a viver. Não é mais o caso de pedir a ela, como
ocorria na adolescência, que me preservasse das feridas
que eu poderia sofrer nos encontros com pessoas reais;
em lugar de excluir as experiências vividas, ela me faz
descobrir mundos que se colocam em continuidade com
essas experiências e me permite melhor compreendê-las.
Não creio ser o único a vê-la assim. Mais densa e mais
eloqüente que a vida cotidiana, mas não radicalmente
diferente, a literatura amplia o nosso universo, incita-nos
a imaginar outras maneiras de concebê-lo e organizá-lo.
Somos todos feitos do que os outros seres humanos nos
dão:  primeiro  nossos  pais,  depois  aqueles  que  nos
cercam; a literatura abre ao infinito essa possibilidade de
interação  com  os  outros  e,  por  isso,  nos  enriquece
infinitamente.  Ela  nos  proporciona  sensações
insubstituíveis que fazem o mundo real se tornar mais
pleno de sentido e belo.
Longe de ser um simples entretenimento, uma distração
reservada às pessoas educadas, ela permite que cada um
responda melhor à sua vocação de ser humano. (2009, p.
23-24).
Como escrevia poeticamente Höderlin, onde mora o perigo, mora também o que
salva.  A devastadora perda de sentido torna-se necessidade vital de redescoberta e
recriação de sentido. Com isso, engendra novas considerações sobre a poesia, tanto na
compreensão do processo criativo e da obra, como da sua convivência com os leitores.
Trata-se, também, de religação com a vida, de reconhecer a poesia como forma
de conhecimento, de sensibilidade, de pensamento, de imaginação. Forma de interpretar
e transformar a existência. Esta concepção transfigura a experiência da leitura, que se
reconhece como criação de sentido.
Despertar o desejo de ler
Uma forma de felicidade é a leitura.
Jorge Luiz Borges
Ler significa aproximar-se de algo
que acaba de ganhar existência.
Ítalo Calvino
Ao  discorrer  sobre  direitos  humanos  e  literatura,  Antônio  Cândido  fez
considerações que se tornaram, de imediato, referência para pensarmos a necessidade do
acesso à leitura literária ou à sua escuta, como dimensão do processo histórico de
humanização:
Entendo  aqui  por  humanização (...)  o  processo  que
confirma  no  homem  aqueles  traços  que  reputamos
essenciais, como o exercício da reflexão, a aquisição do
saber,  a  boa  disposição  para  com  o  próximo,  o
afinamento das emoções, a capacidade de penetrar nos
problemas da vida, o senso da beleza, a percepção da
complexidade do mundo e dos seres, o cultivo do humor.
A literatura desenvolve em nós a quota de humanidade na
medida em que nos torna mais compreensivos e abertos
para a natureza, a sociedade, o semelhante. (1995, p.249)
Portanto, a luta pelos direitos humanos abrange a luta por
um estado de coisas em que todos possam ter acesso aos
diferentes  níveis  da  cultura. A  distinção  entre  cultura
popular e cultura erudita não deve servir para justificar e
manter uma separação iníqua, como se do ponto de vista
cultural  a  sociedade  fosse  dividida  em  esferas
incomunicáveis, dando lugar a dois tipos incomunicáveis
de fruidores. Uma sociedade justa pressupõe o respeito
dos direitos humanos, e a fruição da arte e da literatura
em todas  as modalidades  e em  todos  os níveis  é  um
direito inalienável.(1995, p.262,263).
O longo e complexo trabalho de humanizar o homem tem muitas faces. Dentre
elas, duas das mais significativas são o educar a inteligência e o educar a sensibilidade –
inseparáveis.
Entre nós, em nossa sociedade, essa educação está ligada à formação do leitor.
Um leitor capaz de leitura sensível e crítica, tanto dos textos como da vida. Capaz de
questionamento e de criatividade, não somente no ler, mas também no expressar-se.
Para essa formação, é imprescindível despertar o desejo de ler.
Existem diversos modos, muitos movimentos que podem ajudar a despertar esse
desejo de leitura. Um passo primordial é a religação com a existência, trazer a leitura
para  a vida,  trazendo  a  vida  para a leitura.  Dentre as diferentes possibilidades de
despertar, enumero algumas.
Contar histórias para as crianças. Ler para elas, ler junto com elas. Igualmente,
ler poemas. A leitura em voz alta é fundamental: cultiva a escuta poética dos textos,
assim como a escuta da natureza e da vida humana.
Buscar textos que tenham ressonância nas pessoas que estão sendo iniciadas à
leitura. Ressonância quanto aos temas ou quanto à linguagem. Um exemplo claro:
procurar narrativas com personagens e  enredos que tenham capacidade de despertar
empatia, identificação, pertencimento. Podemos propor exercícios de imaginação, como
os clássicos, de entrar na pele de uma personagem, recriar o narrador, mudar o desfecho,
criar outros tempos e espaços, fazer outros diálogos etc.
É preciso também aproximar as pessoas de textos que inquietem a sensibilidade
e o pensamento com questões existenciais, do sentido da vida, nos vários significados
da palavra sentido: sensação, sentimento, rumo, significação.
Textos com a percepção corpo a corpo com o mundo, suas descobertas, seus
ocultamentos. Os campos sensoriais e suas possibilidades de admiração.
Textos com enredos  que ressoem emocionalmente, como por exemplo com a
questão do desejo de amar e o desejo de ser amado.
Textos com indagações: de onde viemos, para onde vamos. Como fazemos as
travessias.  Os  companheiros  de  viagem.  Assim  também,  indagações  sobre  quem
realmente  somos,  o  que  significa  nossa  existência.  Nessas  questões,  uma  das
permanentes é o conhece-te a ti mesmo, inscrito nos pórticos do templo, em Delfos, que
atravessávamos para a escuta da voz do oráculo que indicaria sinais do que temos sido,
do que precisamos vir a ser.
Além  da  leitura  como  criação  e  recriação  de  sentido  para  a  vida,  outro
movimento é trazer textos com experiências lúdicas, que possibilitem o ato de ler como
alegria,  como  jogo,  como  liberdade.  Ler  com  olhos  leves.  Como  aventura.  Como
descoberta e invenção.
Muitos exercícios podem ser feitos a partir da leitura. Podemos ler e reescrever o
texto,  criar  um  novo  título,  reconhecer  palavras-chave  e  frases-síntese,  mudar  a
sequência dos parágrafos, fazer um desenho, desenvolver uma dramatização, relacionar
à fotografia ou a filmes, produzir um vídeo etc. Podemos também fazer uma antologia:
de textos semelhantes, complementares ou opostos, tanto a partir do tema como da
linguagem. São inúmeras as possibilidades.
Outro campo fecundo é o de pesquisar sobre as relações entre texto e contexto: a
vida do autor, seu tempo histórico, a sociedade em que vive, o chão de onde escreve etc.
São apenas algumas sugestões. Em todas, a convivência com livros é necessária,
em  casa,  na  escola,  em  espaços  comunitários,  em  bibliotecas  públicas. Também  é
necessário  conversar  sobre  as  experiências  de  leitura,  como  por  exemplo  criando
círculos de leitores, em que cada um fala dos livros lidos, sugere leituras que façam
sentido, que despertem o gosto de imaginar, de sentir, de viver.
É  imprescindível  conversar  sobre  os  livros.  Relacionar  as  leituras  com  as
histórias  de  vida.  De  modo  especial,  falar  dos  textos  mais  amados,  os  que  não
esquecemos, os que fazem parte de nós.
A convivência com os livros é encontro humano. Esses círculos de leitura– nas
casas,  nas  escolas,  nas  comunidades,  nos  movimentos  sociais  –  possibilitam  o
reencontro da alegria de conviver, tantas vezes esquecida.
É verdade que aprendemos a ler, lendo; aprendemos a escrever, escrevendo. No
entanto,  é  preciso  o  encontro  humano,  a  conversa,  a  circulação  das  vozes,  o
compartilhar as histórias.
Esta é uma idéia matriz: despertar o desejo de ler, que não se separa do desejo de
pensar, de sentir, de viver, de conviver. Essa reaproximação com a vida é essencial. Sem
essa religação, a leitura raramente floresce, a não ser quando os livros substituem o
mundo, e o ato de ler pretende ocupar o vazio do que é deixado de viver. Não é essa a
nossa proposta, mas a da leitura como uma das dimensões da vida.
Assim, reitero: uma questão fundamental é despertar o desejo e religar a leitura
com o sentido da vida. Não se pode impor a leitura, nem desfigurá-la em uma atividade
mecânica,  nem  reduzi-la  a  fins  imediatamente  utilitários,  nem  desnaturá-la  em
questionários com perguntas burocráticas, sem sensibilidade nem imaginação.
Daniel Pennac, em Como um romance (2008), faz um decálogo com os direitos
de leitor, exposto na contra capa de seu livro:
Direitos do leitor
1. O direito de não ler.
2. O direito de pular páginas.
3. O direito de não terminar um livro.
4. O direito de reler.
5. O direito de ler qualquer coisa.
6.  O  direito  ao  bovarismo  (doença  textualmente
transmissível).
7. O direito de ler em qualquer lugar.
8. O direito de ler uma frase aqui e outra ali.
9. O direito de ler em voz alta.
10.O direito de se calar.
A leitura é uma experiência de liberdade. Uma forma de viver, de criar e recriar a
vida.
Despertado o desejo de ler, muitas vezes inicia-se uma longa convivência, um
duradouro amor, uma travessia de existência inteira.
Alberto Manguel, em História da Leitura  (1997), faz uma celebração do amor
aos livros e ao ato de ler. Na contra-capa, são enumerados alguns exemplos:
Leitor  voraz  e  ciumento,  um  grão-vizir  da  Pérsia
carregava sua biblioteca quando viajava, acomodando-a
em quatrocentos camelos treinados para andar em ordem
alfabética. Em 1536, a Lista de preços das prostitutas de
Veneza anunciava uma profissional que se dizia amante
da poesia e tinha sempre à mão algum livrete de Petrarca,
Virgílio ou Homero. Na 2ª metade do século XIX, em
Cuba,  os  operários  de  algumas  fábricas  de  charuto
pagavam um  lector,  um leitor que se sentava junto às
bancadas  de  trabalho  e  lia  alto  enquanto  eles
manuseavam  o  fumo.  Lia,  por  exemplo,  romances
didáticos, compêndios históricos e manuais de economia
política. A ditadura de Pinochet baniu o  Dom Quixote,
identificando ali apelos à liberdade individual e ataques à
autoridade instituída.
A  leitura  é  a  mais  civilizada  das  paixões.  Mesmo
quando registra atos de barbarismos, sua história é uma
celebração da alegria e da liberdade.
O leitor como coautor
O poema não é uma forma literária,
mas o lugar de encontro
entre a poesia e o homem.
O leitor procura algo no poema,
e não é insólito que o encontre:
já o trazia dentro de si.
Octavio Paz
O  texto  é  um  campo  de  possíveis  significações,  especialmente  o  poético,
tessitura de muitos sentidos.
A idéia do leitor como co-autor, uma vez que ele descobre e estabelece relações,
a partir do conjunto de possibilidades propiciadas pelo texto, está presente em muitas
abordagens teóricas que reconhecem a elaboração ativa do sujeito que lê e, ao ler faz
escolhas, analisa, inter- relaciona, dialoga, entretece novas conexões entre o texto e a
vida.
Uma das vertentes que reconhece o papel ativo do leitor na produção de sentidos
é o pensamento de Bakhtin. A partir dele, Wanderlei Geraldi escreve, em  Portos de
Passagem, sobre a atividade dialógica presente na leitura:
O produto do trabalho de produção se oferece ao leitor, e
nele se realiza a cada leitura, num processo dialógico
cuja trama toma as pontas dos fios do bordado tecido
para  tecer  sempre  o  mesmo  e  outro  bordado,  pois  as
mãos que agora tecem trazem e traçam outra história.
Não são mãos amarradas – se o fossem, a leitura seria
reconhecimento de sentidos e não produção de sentidos;
não são mãos livres que produzem seu bordado apenas
com os fios que trazem nas veias de sua história – se o
fossem, a leitura seria um outro bordado que se sobrepõe
ao  bordado  que  se  lê,  ocultando-o,  apagando-o,
substituindo-o.  São  mãos  carregadas  de  fios,  que
retomam  e  tomam  os  fios  que  no  que  se  disse  pelas
estratégias de dizer se oferecem para tecedura do mesmo
e outro bordado. É o encontro destes fios que produz a
cadeia de leituras construindo os sentidos de um texto.
(1997, p.166).
A leitura poética desperta e intensifica essa atividade do leitor, porque vai muito
além da esfera das idéias, do pensar por conceitos. O poema pensa por imagens, ritmos,
sentimentos – indissociáveis das idéias.
Mais intensamente do que nas outras leituras, a poética conjuga distanciamento e
pertencimento.
Distanciamento, porque é um ver com outro olhar, ver o ainda não visto, ver o já
visto – mas com olhos novos, como escrevia T.S.Eliot .
Pertencimento,  porque  desperta  identificações,  semelhanças,  convergências,
ressonâncias, empatias.
Muitas vezes nos reconhecemos em um texto: ele parece falar diretamente a nós.
Assim,  na  alquimia  da  leitura  poética,  descobrimos  a  nós  mesmos  e  aos  outros,
descoberta  que  é  também  um  ampliar  as  margens  da  consciência,  um  alargar
possibilidades de vir a ser.
Com os poemas, com a leitura sensível e criadora, o leitor se reconhece como
co-autor: revive as imagens.
Mais algumas considerações de Todorov:
A literatura pode muito. Ela pode nos estender a mão
quando estamos profundamente deprimidos, nos tornar
ainda mais próximos dos outros seres humanos que nos
cercam, nos fazer compreender melhor o mundo e nos
ajudar  a  viver.  Não  que  ela  seja,  antes  de  tudo,  uma
técnica de cuidados para com a alma; porém, revelação
do  mundo,  ela  pode  também,  em  seu  percurso,  nos
transformar  a  cada  um  de  nós  a  partir  de  dentro. A
literatura tem um papel vital a cumprir; mas por isso é
preciso  tomá-la  no  sentido  amplo  e  intenso  que
prevaleceu na Europa até fins do século XIX e que hoje é
marginalizado,  quando  triunfa  uma  concepção
absurdamente reduzida do literário. O leitor comum, que
continua a procurar nas obras que lê aquilo que pode dar
sentido à sua vida, tem razão contra professores, críticos
e escritores que lhe dizem que a literatura só fala de si
mesma ou que apenas pode ensinar o desespero. Se esse
leitor  não  tivesse  razão,  a  leitura  estaria  condenada  a
desaparecer num curto prazo. (2009, p. 76-77).
Em nosso tempo, convivemos cotidianamente com a crise da palavra, da leitura,
da literatura  e da poesia. Convivemos também com muitos sinais de  resistência  e
renascimento. Disseminam-se por toda a parte contadores de histórias. Disseminam-se
grupos de leitores, rodas de leitura, saraus, encontros literários.
Considerações finais
Tudo se torna poesia quando olhamos de dentro...
porque poesia é ciência, é o sopro do mesmo
espírito pelo qual a natureza vive.
Emerson
Viver a poesia é muito mais necessário
e importante do que escrevê-la.
Murilo Mendes
A convivência com a poesia desperta e desenvolve a leitura nas entrelinhas, a
escuta de outros sentidos, no texto e para além dele, na vida – a de cada um e a de todos.
Educa a sensibilidade, a inteligência, a imaginação. Possibilita a redescoberta da
experiência, de muitos milênios, de ler o que nunca foi escrito,  ler o mundo  – essa
metáfora antiqüíssima.
Nesta concepção, a poesia possibilita reconhecer o mundo como texto – sempre
inacabado, em movimento, entretecido por múltiplas vozes. A poesia também nos educa
a escrever o mundo, que é sempre um reescrever.
Nessa leitura e nessa escrita, podemos nos reconhecer uns aos outros, uns nos
outros. Esta é a utopia poética, o que ainda não existe, mas precisa existir: a existência
como um poema, entretecido com os fios que ligam história e poesia, ligam o que foi e
o  que  poderia  ter  sido,  assim  como  evocam  e  invocam  o  que  pode  vir  a  ser  –
cotidianamente, constelarmente.
Referências bibliográficas
ANTÔNIO, Severino. O visível e o invisível. Campinas, SP: Verus editora, 2008.
______. Uma nova escuta poética da educação e do conhecimento.São Paulo: Paulus,
2009.
ARENDT, Hannah.  Homens em tempos sombrios.  São Paulo: Companhia das Letras,
1987.
BORDELOIS, Ivonne. A palavra ameaçada. Rio de Janeiro: Vieira et Lent, 2005.
CALVINO, Ítalo.  Seis propostas para o próximo milênio.São Paulo: Companhia das
Letras,1990.
CANDIDO, Antonio.Vários Escritos. 3ª ed. São Paulo: Duas Cidades, 1995.
GERALDI, João Wanderlei.  Portos de passagem. 4ªed. São Paulo: Martins Fontes,
1997.
MANGUEL, Alberto.  Uma História da Leitura.   São Paulo: Companhia das Letras,
1997.
PAZ, Octavio. O arco e a lira. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1982.
PENNAC, Daniel. Como um romance. Rio de Janeiro: Rocco/L&PM, 2008.
SARAMAGO, José.  Prémio Nobel: Discurso de José Saramago na Academia Sueca.
Disponível  em:  http://www.g-sat.net/nobel-da-literatura-2404/premio-nobel-discursode-jose-saramago-na-academia-sueca-341357.html#ixzz1Db1rOuIHacesso em 27 mar
2011.
TODOROV, Tzvetan. A literatura em perigo. Rio de Janeiro: DIFEL



terça-feira, 15 de outubro de 2013


Para Paulo Freire, o autoritarismo escolar permeia todo o sistema escolar. Como nós, enquanto Educadores, vamos
enfrentar tal desafio?


Apresentaremos um trabalho (estudo de caso) da UNISAL - Unidade Dom Bosco, em Americana/SP, na Uninove, mais especificamente no Seminário Internacional homenageando Paulo Freire e a Educação Superior. Gostaria de socializar com todos este trabalho.



EIXO TEMÁTICO - Pensamento de Paulo Freire e Educação superior

Paulo Freire e a educação superior: novos aportes e subsídios para se entender como seu pensamento fertiliza e ressignifica o meio acadêmico no século XXI, no contexto de um curso de Moda

Identificação dos autores – Prof. Tadeu de Jesus Giatti
                                          Profa. Keila Mourana Marques Silva
                                          Profa. Sônia Maria Souza Ferrari
Proponente do Texto – Prof. Tadeu de Jesus Giatti
Titulação Acadêmica – Mestrando em Educação pela Unisal – Centro Universitário Salesiano de São Paulo – Campus Maria Auxiliadora – Americana/SP. Professor de Língua Portuguesa na Secretaria de Estado de São Paulo.
Função e origem – Centro Universitário Salesiano de São Paulo – Campus Maria Auxiliadora – Americana/SP.
País de Origem - Brasil
Prof. Orientador - Prof. Dr. Severino Antônio Moreira Barbosa


RESUMO: Este trabalho objetiva analisar a relação entre o pensamento freiriano e de Dom Bosco, no âmbito da educação socioeducacional e a atual educação superior, assim como lançar luzes sobre novas perspectivas que o pensamento construtivista idealizado por Freire pode contribuir para o meio acadêmico nesta segunda década do século XXI, no âmbito de ensino/pesquisa no contexto de aulas ministradas na Unisal – curso de Pedagogia (curso de Moda).
Palavras-chave: Paulo Freire – Educação Superior – Ensino/Pesquisa na Universidade

1. INTRODUÇÃO
1.1 Paulo Freire e Dom Bosco – dois modelos de idealizadores de Educação Informal e não-formal

A Unisal – Universidade Salesiana – campus de Maria Auxiliadora, localizada em Americana/SP, Curso de Mestrado em Educação Socioeducacional tem por linha de pesquisa dois eixos: Linha 1 – Análise histórica da práxis educativa nas experiências sociocomunitárias e institucionais. Sendo que objetiva a investigação e pesquisas de ordem teórico-metodológica e da práxis, centralizadas no reconhecimento das múltiplas contribuições históricas oferecidas pelas instituições educativas e a incidência dos projetos político pedagógicos por elas atuados nos seus contextos socioculturais. Esses estudos relativos às contribuições histórico-pedagógicas das experiências sociocomunitárias e institucionais têm por objetivo proporcionar subsídios que favoreçam a construção da autonomia e a transformação social.

Já o segundo eixo - Linha 2 – A intervenção educativa sociocomunitária: linguagem, intersubjetividade e práxis, estuda a investigação das ações e das formas de intervenção educativa sociocomunitária a partir das articulações das linguagens como construção do conhecimento, apreensão e transformação do mundo. A construção do discurso pedagógico na contemporaneidade, como crítica à coisificação do educando, como desenvolvimento de alteridade e autonomia. Os instrumentos de elaboração e interpretação das linguagens para compreensão e significação histórica da práxis educativa.

                   Como se pode depreender, a educação informal e não formal são a base da filosofia epistemológica da Unisal, assim como a alteridade e criticidade através da ênfase em Educação sociocomunitária. Isto não quer significar que a educação formal, a instituída e sacramentada pela sociedade não seja valorizada, mas, seguindo os passos de Paulo Freire, a instituição preza pela construção contínua da autonomia e da transformação social, tão caras ao pensamento freiriano. Neste sentido, a intenção de partilhar este trabalho no IV Seminário Internacional de Educação “Paulo Freire e Educação Superior” promovido pela Uninove. As provocações ocorridas nesta interação – da ambiência de espaços formais e informais – ocorridas nos espaços da Unisal – justificam a importância de se problematizar nossos questionamentos sobre o trabalho coletivo que reveste nossas concepções teóricas.
Pode-se constatar que as abordagens de nossos estudos ou leituras críticas da obra de Paulo Freire são plurais: tanto o relato e análise de experiências, a divulgação de nossos trabalhos acadêmicos, aggiornamento dos conceitos do autor, dentre outros. Neste sentido, é fácil a percepção do caráter da contribuição freiriana para a ressignificação e recriação de práticas educativas informais e não formais em diversas áreas, assim como campos de nossa atuação profissional.
Tecidas estas considerações preliminares, e também tendo em mente o eixo temático do Seminário Internacional – Paulo Freire e a Educação Superior - é importante ressaltar um importante aspecto. Ele nada mais é do que entender quais os novos aporte e subsídios que ocorrem no pensamento de Paulo Freire para se entender como seu pensamento fertiliza e ressignifica o meio acadêmico no século XXI, através da temática da docência em ensino superior. Ou, em outras palavras: como encarnamos/recriamos em nossa própria docência tanto os conceitos, princípios ou ainda fundamentos que norteiam nossas investigações e estudos? Estamos, efetivamente, socializando o aporte recebido e gerado em nossa prática docente? Temos aproveitado as oportunidades e contribuído para o ambiente institucional universitário? Em última análise, objetiva-se analisar sob a lupa freiriana a própria prática docente, no que concerne a tão importante e inseparável relação ensino/pesquisa que tem sido descurada e denunciada à exaustão pelo meio acadêmico. Senão vejamos:

Fala-se hoje, com insistência, no professor pesquisador. No meu entender o que há de pesquisador no professor não é uma qualidade ou uma forma de ser ou de atuar que se acrescente à de ensinar. Faz parte da natureza da prática docente a indagação, a busca, a pesquisa. O de que se precisa é que, em sua formação permanente, o professor se perceba e se assuma, porque professor, como pesquisador (1996, p.32).


Justifica-se tal reflexão, visto que ela não diz respeito àqueles que vivenciam o processo ensino/aprendizagem – professores e professoras universitários – mas também àqueles que são atingidos pelas repercussões de sua docência. Entendemos que deve, mais do que nunca, haver um esforço para, como Paulo Freire muito bem pontuou, haver a eliminação de uma “educação bancária” nas fases iniciais da formação acadêmica, para uma mudança das práticas educativas em âmbito generalizante. Ou, em outras palavras, o que queremos dizer é que o processo ensino/aprendizagem e a pesquisa em nossas experiências universitárias são um elemento formativo insubstituível para a fomentação e criação de um novo senso comum em torno do ato de ensinar, com o intuito de ressignificar a expressão de que “ensinar não é transferir conhecimento, mas criar possibilidades para a sua produção ou a sua construção” (Freire, 1996, p.25), em processos educativos que não priorizam o conteúdo, mas sim fazem de sua práxis a centralidade dos sujeitos e tomam como ponto de honra a superação dos aspectos institucionais  que legalizam as relações excludentes.  
Dentro de nossa instituição, que tem como fio condutor, como já foi ventilado, a educação informal e não formal, através de ações que valorizam o aprendizado extra-acadêmico, em vivências corriqueiras, sociais, familiares, religiosas, em conversas de bar, ou em um simples “bate papo”, queremos fazer um recorte e analisar como esta visão de educação, levantada e propugnada por Dom Bosco, na Itália, e sendo ideário da Unisal, como sua legítima herdeira, está sendo implementada no âmbito acadêmico. Não custa frisar que esta visão de mundo bosquiana tem simetria muito forte com o pensamento da  pedagogia do oprimido de Paulo Freire, razão pela qual optou-se em fazer este estudo dentro do eixo de pesquisa do curso de Mestrado em Educação linha dois (02) e sua inserção bosquiana/freiriana no contexto de Ensino Superior.
                       
2. DESENVOLVIMENTO

2.1 A gestação da curiosidade epistemológica enquanto elemento instigador à formação do educador

É inquestionável que a curiosidade epistemológica, dentre outros tópicos que perfazem os saberes necessários à prática educativa, assim como a categoria de investigação é um iter que constitui a prática docente crítica-reflexiva. Enquanto elemento componente da criticidade, pode-se dizer que a curiosidade epistemológica  é a instância principal para se haver o processo ensino/aprendizagem, sendo um produto-produtora do processo de estudo e pesquisa sobre a própria prática, dir-se-ia um questionamento sobre a incompletude do conhecimento.
Vamos focar um diálogo havido entre Paulo Freire e Carlos Torres, quando de seu desligamento da Secretaria de Educação de São Paulo, no que tange à construção do conhecimento.

Carlos Torres: (...)Qual é a herança de Paulo Freire para nós, educadores latino-americanos e de outras partes do mundo? (...)
Paulo Freire: Qual a herança que posso deixar? Exatamente uma. Penso que poderá ser dito quando já não esteja no mundo: Paulo Freire foi um homem que amou. Ele não podia compreender a vida e a existência humana sem amor e sem a busca de conhecimento. Paulo Freire viveu, amou e tentou saber. Por isso mesmo, foi um ser constantemente curioso. (1991, p. 139-140)

Ecoando Aristóteles que dizia é natural que todo homem, por natureza deseja saber”, (Aristóteles, Metafísica, 980ª), Paulo Freire considera a curiosidade como uma necessidade ontológica do ser humano; característica fundamental  em sua busca permanente de saberes que lhe possibilitem a criação e recriação de sua própria existência; “uma espécie de abertura à compreensão do que se acha na órbita do ser desafiado” (Freire, 1995, p.76). Segundo Paulo Freire, essa curiosidade, ao ultrapassar os “limites que lhe são peculiares do domínio vital, se torna fundante da produção do conhecimento” (Freire, 1996, p.61).
Todavia, essa curiosidade e postura epistemológica, a fim de se efetivarem e cristalizarem no ato de conhecer, devem se ligar a uma educação crítica, prenhe e fértil do ato de transformar a realidade. Neste sentido, Freire, ao conceituar a educação como “um ato de conhecimento, uma aproximação crítica da realidade” (Freire, 1979 a, p. 25), considera os atos de ensinar e aprender, que caracterizam a natureza da prática educativa, enquanto “dimensões do processo maior - o de conhecer” (1992, p.110). Dentro desta perspectiva crítica epistemológica, propõe, em contrapartida à concepção de educação bancária, emasculadora da curiosidade dos educandos, uma concepção problematizadora e libertadora de educação partindo do ponto de qual seja a capacidade de conhecer, vinculada à curiosidade em torno do objeto, constituindo-se numa vivência permanente do “desafio à curiosidade ingênua do educando para, com ele, partejar a criticidade” (Freire, 1995, p.79) e ir forjando a  constituição da curiosidade epistemológica.
Então, para Freire, a curiosidade epistemológica é aquela que, ao viabilizar a tomada de distância do objeto, transcende os limites do cotidiano na qual nossa mente não opera epistemologicamente. Própria da “consciência crítica, aquela que não se satisfaz com as aparências” (Freire, 1979 b, p.40) e busca a compreensão dos problemas com maior profundidade, a curiosidade epistemológica não é qualquer curiosidade, mas é a curiosidade que está ligada ao tão difícil quanto prazeroso ato de estudar. Assim, ao destacar sua compreensão do conhecimento enquanto produção social, considera-o resultante “da ação e reflexão, da curiosidade em constante movimento de procura” (Freire, 1993, p. 9-10). Analisa como o homem foi, ao longo de sua história, aprimorando sua capacidade de conhecer ao aperfeiçoar seus métodos de aproximação dos objetos para melhor compreendê-los, para ultrapassar o nível meramente opinativo (ibid, p.11), transformando sua curiosidade ingênua  numa “curiosidade exigente, metodizada com rigor, que procura achados com maior exatidão” (ibid).
Em razão disto, existe a preocupação com “uma prática formadora fundada no estímulo e no desenvolvimento da curiosidade epistemológica” (Freire,1994, p.130), enfatizando  a necessidade de uma educação comprometedora em promover a travessia da  curiosidade ingênua à curiosidade epistemológica,  a fim de estimular, de maneira crítica, a capacidade de aprender,  assim como de aventurar-se e arriscar-se na tarefa fundamental da inteligibilidade crítica do mundo.
Através da superação da curiosidade ingênua, Freire justifica sua ansiedade com uma educação que vença a superação da curiosidade ingênua  a partir de seu entendimento de que a mesma não se dá automaticamente, mas sim “se dá na medida em que a curiosidade ingênua, sem deixar de ser curiosidade, pelo contrário, continuando a ser curiosidade, se criticiza” (Freire,1996, p.34). De acordo com ele, a fim de que se dê esse processo de criticização da curiosidade, nada mais natural do que a criação e o desenvolvimento de uma rigorosidade metódica que amplie as possibilidades de nossas buscas epistemológicas, pois “essa rigorosidade metódica é que faz a passagem do conhecimento ao nível do senso comum para o do conhecimento científico” (Freire, 1995, p.78). Entretanto, alerta-nos para que não nos deixemos levar pela “tentação de supervalorizar a ciência e menosprezar o senso comum” (Freire, 1993, p.11). Neste sentido, o menosprezar o saber de experiência feito já seria uma maneira de elitizar a educação, assim como fazer da ciência algo absolutizado.
O processo de conhecimento transita da ingenuidade (Freire, 1996, p.32) para a criticidade, que se constitui a curiosidade epistemológica. Uma séria disciplina intelectual irá sendo forjada no exercício desta rigorosidade metódica, no sentido da vivência do significado próprio que Freire atribui ao rigor. Para ele, trata-se de um rigor criativo:
(...) aquele pelo qual você faz mais do que observar - você interpreta a realidade(...)começo a notar cada vez mais, na minha observação que o objeto não é algo em si mesmo, mas está dialeticamente se relacionando com outros que constituem uma totalidade. (Freire, 1986, p. 104)

Tomando-se como princípio que, sem o exercício da curiosidade epistemológica, “deteriora-se a prática educativa progressista” (Freire, 1995, p.79), existe a preocupação com o desenvolvimento da mesma no âmbito escolar, dizendo que este pode ser vivenciado “enquanto um contexto aberto ao exercício da curiosidade epistemológica” (ibid., p.78) e ainda levando-se em conta que ele deveria ser uma “preocupação de todo projeto educativo sério” (ibid). Tal projeto inovador faz parte de seu sonho de reinvenção da escola, o qual, segundo ele, não se implementará sem um grande investimento na formação permanente de professores(as), visto que é preciso que se reinvente a escola partindo-se da base reflexiva feita na própria escola.
Neste patamar, é imprescindível que os meios e recursos de formação permanente na escola poderão ser reinventados para tornarem-se espaços privilegiados de fomento à curiosidade epistemológica. A partir destes, intencionalmente organizados e planejados para tanto, haverá a instauração de um diálogo sobre o ensinar e o aprender que poderá vir a ser um caráter desafiador desta curiosidade epistemológica que impulsiona o professor na busca de ter um papel ativo (sujeito da produção do conhecimento) para construir e poder suplantar a superação da pedagogia da resposta por outra, ou seja, a pedagogia da pergunta. Deste modo, poder-se-á gestar uma pedagogia da curiosidade na qual o professor, ao vivenciar de modo permanente a curiosidade de aprender, será provocado a recriá-la na complexa  relação com seus aprendentes.
Como consequência, o vivenciar uma curiosidade epistemológica no dia a dia escolar poderá ser uma oportunidade de uma possibilidade de expressão de prazer de ensinar e aprender, visto que “quanto mais metodicamente rigoroso me torno na minha busca e na minha docência, tanto mais alegre me sinto e esperançoso também” (Freire, 1996, p.160). Sem dúvida, isto é um desafio a ser superado e materializado no ambiente escolar. Também é necessário que o educador torne possíveis de serem vivenciáveis tais possibilidades em seu processo de formação inicial, para que possa recriá-las no cotidiano de seu trabalho.

2.2. Aprendendo com a própria história: o trabalho com alunas do Curso de Modas na Unisal – campus centro – Dom Bosco de Americana/SP.

Como alunos do curso de Mestrado em Educação pela Unisal – campus Maria Auxiliadora, Americana/SP, tentamos buscar o entendimento do vocábulo curiosidade epistemológica na obra de Paulo Freire, e também temos como premissa de tomá-la como um desafio enquanto estudantes e estagiários no programa PED (Programa de Estágio Docente) no Curso de Modas, instituído pela Mantenedora, objetivando o aprimoramento do aluno mestrando em sua prática acadêmica futura, assim como o inter-relacionamento com alunos (as) do curso, auxiliando o professor a ministrar as aulas, sendo agente motivador do processo ensino/aprendizagem. Neste sentido, um dos pontos fundamentais que objetivo tematizar é o próprio processo formador que constrói as condições de possibilidade visando à promoção da curiosidade ingênua à curiosidade epistemológica, processo esse, segundo Paulo Freire,  que demanda uma  rigorosidade metódica capaz de desenvolver a disciplina intelectual necessária para tal. Esta tem sido uma preocupação que orienta meu que fazer neste estágio PED, assim como norteia minha carreira docente.
O professor que ministra as aulas da disciplina Processos Criativos, que é eletiva, Dr. Severino Antônio Moreira Barbosa, objetiva, com ela, suscitar nos alunos (as) do Curso de Moda a criatividade, vital para esses futuros profissionais em seu futuro campo de trabalho.
            Não há dúvida de que a partilha da reflexão fertiliza e ressignifica o levantamento de novas questões que contribuem para superar as dificuldades enfrentadas e ampliar as vivências de possibilidade. Assim, no dinamismo que constitui o ato de pesquisar a própria prática, o ensino se faz gerador de alegria. A alegria de aprender e ensinar move o ato pedagógico na perspectiva da construção da autonomia do aluno/a e também do professor/a, num processo mútuo e permanente de construção do conhecimento, em que a alegria não se opõe ao rigor e à seriedade inerentes ao ato crítico de estudar.

Pelo contrário, quanto mais metodicamente rigoroso me torno na minha busca e na minha docência, tanto mais alegre me sinto e esperançoso também. A alegria não chega apenas no encontro do achado mas faz parte do processo da busca. E ensinar e aprender não podem dar-se fora da procura, fora da boniteza e da alegria (Freire, 1996, p.160).

Temos um desafio que nos tem acompanhado no trabalho docente de formação de professor, e também como Mestrandos em Educação, ou seja: estabelecer uma relação pedagógica na qual se descubra o prazer de aprender, em que se vivencie uma nova relação subjetiva com a leitura e a escrita enquanto atos inerentes ao exercício crítico da reflexão sobre a prática profissional da docência. É esse o entendimento que nos leva a iniciar cada novo semestre tomando o desenvolvimento da curiosidade epistemológica como uma meta que orienta a organização do contrato didático a ser estabelecido com novas turmas, em especial esta de Curso de Modas na qual temos exercido o estágio PED.
Como viabilizar um contrato didático comprometido com uma concepção libertadora da educação?  Eis uma preocupação que nos tem orientado a proposição de diversos movimentos dos quais resultaram o estabelecimento de quatro compromissos fundamentais que hoje são ponto de partida para a organização do trabalho com cada turma do curso de Modas na Unisal, por parte do professor Severino, ao iniciar um semestre letivo: o compromisso com o coletivo, que inclui a presença e a participação, entre outros; o compromisso com a reflexão, que diz respeito ao envolvimento nas discussões, anotações em processo, etc; o compromisso com a leitura/escrita na realização das leituras indicadas e entrega de trabalhos; e o compromisso com a construção de conceitos (novos) a partir dos eixos temáticos trabalhados.
Quais as possibilidades de criar, no âmbito da formação inicial, instrumentos metodológicos que potencializem a necessária vivência da curiosidade epistemológica para que o professor se assuma como sujeito da práxis educativa libertadora? Desta inquietação nasceu e vem se desenvolvendo o trabalho através de relatórios que estamos fazendo quanto à participação dos alunos (as) nas aulas do professor Dr. Severino Antônio Moreira Barbosa.
A bem da verdade, a curiosidade epistemológica enquanto práxis educativa libertadora, no curso de educação superior de Modas na Unisal foi estabelecida aos poucos pelo condutor do processo pedagógico. A princípio os alunos (as) eram arredios (as) à ideia de uma disciplina eletiva, e ainda mais que se trabalhava com conceitos tais como: retratar através de metáforas a realidade, evocar imagens de infância, comparações originais, estranhamento do objeto da natureza ou de produtos humanos. Entrementes, com a curiosidade epistemológica, os alunos conseguiram suplantar a fase de fastídio e desdém pela disciplina e começaram a se envolver no processo de aprendizagem. Isto através do uso de questionamentos críticos, tomando por base a curiosidade epistemológica, e depois visando despertar a práxis educativa libertadora.
Também merece destaque a reflexão em torno do modo como o trabalho com os relatórios de aulas assistidas, possibilita a vivência positiva da tensão entre a obrigatoriedade e a autonomia, na perspectiva proposta por Snyders (1993) de que “as obrigações escolares podem levar os alunos a uma independência que torna quase insignificante a liberdade que eles pensam encontrar quando fazem muito simplesmente tudo de que têm vontade na hora” (p.114). A obrigatoriedade de fazê-los tem sido condicionada à escolha de cada um/a sobre quando fazê-lo, bem como à forma própria de sua elaboração.
Neste diapasão, a escrita, o diálogo e a curiosidade vão sendo assumidos como compromissos individuais e coletivos, à medida que, tanto cada um/a vai exercitando-se em sua própria forma de pensar, de ter uma curiosidade epistemológica. A obrigatoriedade da escrita, assim como o de pensar novas formas de processos criativos, vai cumprindo sua função educativa. Sobretudo, é possível perceber descobrir novas formas criativas, objetivo último da disciplina, faz pensar, dá trabalho, requer tempo e dedicação, mas vem-se constituindo como importante instrumento metodológico na perspectiva do desenvolvimento da curiosidade epistemológica.

3. Da intenção à vivência, significados em construção e fertilizadores no meio acadêmico - Curso de Moda da Unisal – segundo conceito de Paulo Freire e Dom Bosco.

Esta experiência do PED (exigência do Curso de Mestrado em Educação) junto ao curso de Modas da Unisal  trouxe-nos aportes preciosos quanto ao nosso fazer e saberes acadêmicos. Especialmente porque pudemos constatar in loco a importância do pensamento freiriano da curiosidade epistemológica e a práxis educativa libertadora.
Como já foi dito, a turma sendo heterogênea, havia poucas pessoas interessadas na disciplina processos criativos. Para ser bem franco, não havia curiosidade epistemológica alguma, pelo horário desta aula (das 21h00 às 22h50) e também por taxá-la como desnecessária e inútil. Entrementes, o professor titular  conseguiu, com propriedade, utilizando-se dos conceitos de educação libertadora, construção conjunta de conhecimento e curiosidade em conhecer, incitar o gosto por este estudo que é fulcral e necessário a futuros profissionais da moda que devem ter uma mente aberta a novas criações.
O diálogo sempre foi utilizado como instrumento de iniciação das aulas, com respeito às opiniões contrárias, mesmo daqueles que não queriam assistir às aulas, reputando-as de desnecessárias e não úteis à futura formação profissional. Aliado ao diálogo, o questionamento e o direito de voz e de vez aos alunos foi outra constante nas observações das aulas. Havia o direito de se posicionar, o que era estranho para estes alunos, pois sempre foram coagidos a aceitar a opinião alheia sem questionamento. Este direito de posicionamento, do respeito à alteridade é uma característica da educação sociocomunitária de extrato de Dom Bosco.
A criticidade foi outro aspecto trabalhado muito nestas aulas com os alunos. Uma educação crítica, não imposta de cima para baixo, mas que questiona, que sopesa os lados, conscientizadora, especialmente nos aspectos de Moda, de pessoas que ditarão tendências a serem seguidas, que poderão impor ditaduras de costume, deve ser entendida como, segundo o pensamento de Paulo Freire, Ninguém conscientiza ninguém; Ninguém se conscientiza sozinho; Os homens e as mulheres se conscientizam em comunhão (Freitas, 2001).

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Seria interessante relatar, ao final deste trabalho, o ocorrido em uma aula com os alunos (as) no curso de Modas em nível superior da Unisal. O objetivo da aula era o despertar a motivação da criatividade de uma turma através de uma exposição crítica levada a cabo pelos autores deste paper da Escola de Design Bauhaus que teve seu apogeu entre 1919 e 1933 na Alemanha. Houve uma informação prévia sobre a necessidade crescente de fazer crescer este saber e que o assunto seria abordado em uma aula posterior. Ou, em outras palavras, tentou-se fomentar a curiosidade epistemológica preconizada por Paulo Freire, para, num segundo momento, despertar a pedagogia educacional da práxis libertadora.
Devido à alienação crescente na sociedade, que se reflete no meio acadêmico, não houve este despertar da curiosidade. Todavia, quando os slides do power point, aliados com nossa exposição e incremento de perguntas foram sendo apresentados, notou-se um interesse que nos surpreendeu muito. Após alguns minutos de exposição, a turma foi tomada de um certo êxtase pelo assunto, fazendo-nos ressignificar nossos saberes acadêmicos sobre o assunto. Houve questionamentos que até aquele momento não imaginávamos que ocorressem, ou seja, conseguiu-se despertar o questionamento, base de nossa carreira acadêmica, a criticidade. Através desta última qualidade, os alunos conseguiram compreender o período, assim como as implicações socioeconômicas e políticas desta escola para a Alemanha e para o mundo ocidental.
Pediu-se, posteriormente, um relatório para os (as) alunos, a fim de se aferir o quanto aquele momento de construção conjunto de saberes tinha representado para eles.

Relato de uma prática ineditamente-viável

Sem dúvida, no decorrer desta troca de saberes entre os estagiários e as alunas do Curso de Modas da Unisal, houve o que Freire denomina “ensinar exige saber escutar”. Constatamos isto claramente através dos relatórios solicitados após a aula, para aferir o quanto tínhamos conseguido adentrar na pedagogia preconizada por Freire. Os relatos eram cheios de alegria e agradecimento por termos proporcionado este momento de descontração e de saberes a eles. Não imaginavam que este período histórico poderia agregar tanto conhecimento disciplinar a seu saber/fazer cotidiano. Já tinham ouvido fazer vagamente nesta escola, mas sem NUNCA atentar em estudá-lo com mais afinco. Não há dúvida de que, atualmente, estes dados objeto de estudo na aula, estão disponibilizados na internet, mas não são acessados ou lidos. Bastou que nós motivássemos os alunos (curiosidade epistemológica) para que houvesse esta devolutiva através dos relatórios. No final do mês, houve uma devolutiva muito interessante por parte de uma aluna deste curso, que nos deixou muito contentes e motivados na construção de saberes e certos de que a pedagogia libertadora preconizada por Paulo Freire, é prenhe de significados e resultados.
Trata-se de um cartão recebido juntamente com o relatório de avaliação da aula assistida, com os seguintes dizeres: (...) me fez refletir e rever alguns conceitos em mim enraizados há muito tempo. Sabe aquele “friozinho no estômago”, ao finalizar algo, ou melhor, entregar um depoimento pessoal? É a mesma sensação: A seguir vinha uma fotografia de nosso último encontro, em sala de aula com o professor e nós, estagiários em um momento de confraternização. Após a foto, seguiam suas palavras: Insegurança, medo, receio que não está correto. Porém, é maravilhoso quando chegamos do outro lado, quando conseguimos superar os obstáculos, quando confiamos em nós mesmo, podendo exprimir o que sabemos e compartilhar saberes.
É inquestionável que conseguimos despertar o interesse pelo conhecimento nestes alunos (as), que, a princípio refratários a ele, se tornaram interessados em sua libertação. Não houve uma educação bancária, alvo de críticas acerbas de Paulo Freire, mas sim um despertar, um ressignificar do ato de aprender, através do respeito pela alteridade, pela indiferença, poder-se-ia dizer dos aprendentes. Como a Unisal, dentro da filosofia da educação sociocomunitária, conjugada com a filosofia de freiriana, tão bem consegue materializar, conseguiu-se fertilizar o meio acadêmico de um curso de Modas usando-se conceitos de Paulo Freire – curiosidade epistemológica – e o Dom Bosco, - proporcionar subsídios que favoreçam a construção da autonomia e a transformação social.

5. Referências bibliográficas


FREIRE, Paulo. Conscientização: Teoria e prática da libertação - uma introdução ao pensamento de Paulo Freire. São Paulo: Cortez & Moraes, 1979a

______. Educação e Mudança. 20ª ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1979 b.
______. A Educação na Cidade. São Paulo: Cortez, 1991.

______. Pedagogia da Esperança: Um reencontro com a Pedagogia do oprimido. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1992.
______. Política e Educação: ensaios. São Paulo, Cortez, 1993.   (3ªed. brasileira -1997).
______. Cartas à Cristina . Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1994.
______. Pedagogia da Autonomia: Saberes necessários à prática educativa. São Paulo: Paz e Terra, 1996.
______. À Sombra desta Mangueira. São Paulo: Olho D’Agua, 1995.
FREIRE, Paulo; Shor,Ira. Medo e Ousadia: o cotidiano do professor. 3ª ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1986.
FREITAS, Ana Lúcia Souza de. Pedagogia da Conscientização: um legado de Paulo Freire à formação de professores. Porto Alegre, EDIPUCRS, 2001.

Relatório da aula do dia 20 de agosto de 2013. Disciplina: Processos Criativos, Curso de Modas, Unisal – Unidade Dom Bosco/Centro/Americana.
SNYDERS, Georges. Alunos Felizes: Reflexão sobre a alegria na escola a partir de textos literários. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1993.
_________________. Escola, classe e luta de classes. Lisboa: Moraes Editores, 1997, 2ª. edição.