EIXO TEMÁTICO - Pensamento de Paulo
Freire e Educação superior
Paulo Freire e a
educação superior: novos aportes e subsídios para se entender como seu
pensamento fertiliza e ressignifica o meio acadêmico no século XXI, no contexto
de um curso de Moda
Identificação dos autores
– Prof. Tadeu de Jesus Giatti
Profa. Keila Mourana Marques Silva
Profa. Sônia Maria Souza Ferrari
Proponente do Texto –
Prof. Tadeu de Jesus Giatti
Titulação Acadêmica –
Mestrando em Educação pela Unisal – Centro Universitário Salesiano de São Paulo
– Campus Maria Auxiliadora – Americana/SP. Professor de Língua Portuguesa na
Secretaria de Estado de São Paulo.
Função e origem –
Centro Universitário Salesiano de São Paulo – Campus Maria Auxiliadora –
Americana/SP.
País de Origem - Brasil
Prof. Orientador -
Prof. Dr. Severino Antônio Moreira Barbosa
RESUMO: Este
trabalho objetiva analisar a relação entre o pensamento freiriano e de Dom
Bosco, no âmbito da educação socioeducacional e a atual educação superior,
assim como lançar luzes sobre novas perspectivas que o pensamento
construtivista idealizado por Freire pode contribuir para o meio acadêmico
nesta segunda década do século XXI, no âmbito de ensino/pesquisa no contexto de
aulas ministradas na Unisal – curso de Pedagogia (curso de Moda).
Palavras-chave:
Paulo Freire – Educação Superior – Ensino/Pesquisa na Universidade
1.
INTRODUÇÃO
1.1 Paulo Freire e Dom Bosco – dois
modelos de idealizadores de Educação Informal e não-formal
A
Unisal – Universidade Salesiana – campus de Maria Auxiliadora, localizada em
Americana/SP, Curso de Mestrado em Educação Socioeducacional tem por linha de
pesquisa dois eixos: Linha 1 – Análise histórica da práxis educativa
nas experiências sociocomunitárias e institucionais. Sendo que objetiva a investigação e pesquisas de ordem teórico-metodológica e da práxis,
centralizadas no reconhecimento das múltiplas contribuições históricas
oferecidas pelas instituições educativas e a incidência dos projetos político
pedagógicos por elas atuados nos seus contextos socioculturais. Esses estudos
relativos às contribuições histórico-pedagógicas das experiências
sociocomunitárias e institucionais têm por objetivo proporcionar subsídios que
favoreçam a construção da autonomia e a transformação social.
Já o segundo eixo - Linha 2 – A intervenção educativa
sociocomunitária: linguagem, intersubjetividade e práxis, estuda a investigação das ações e das
formas de intervenção educativa sociocomunitária a partir das articulações das
linguagens como construção do conhecimento, apreensão e transformação do mundo.
A construção do discurso pedagógico na contemporaneidade, como crítica à
coisificação do educando, como desenvolvimento de alteridade e autonomia. Os
instrumentos de elaboração e interpretação das linguagens para compreensão e
significação histórica da práxis educativa.
Como se pode depreender, a educação informal e não formal são a base da
filosofia epistemológica da Unisal, assim como a alteridade e criticidade através
da ênfase em Educação sociocomunitária. Isto não quer significar que a educação
formal, a instituída e sacramentada pela sociedade não seja valorizada, mas,
seguindo os passos de Paulo Freire, a instituição preza pela construção
contínua da autonomia e da transformação social, tão caras ao pensamento
freiriano. Neste sentido, a intenção de partilhar este trabalho no IV Seminário
Internacional de Educação “Paulo Freire e Educação Superior” promovido pela
Uninove. As provocações ocorridas nesta interação – da ambiência de espaços
formais e informais – ocorridas nos espaços da Unisal – justificam a
importância de se problematizar nossos questionamentos sobre o trabalho
coletivo que reveste nossas concepções teóricas.
Pode-se constatar que as abordagens de nossos estudos ou leituras
críticas da obra de Paulo Freire são plurais: tanto o relato e análise de
experiências, a divulgação de nossos trabalhos acadêmicos, aggiornamento dos conceitos do autor, dentre outros. Neste sentido,
é fácil a percepção do caráter da contribuição freiriana para a ressignificação
e recriação de práticas educativas informais e não formais em diversas áreas,
assim como campos de nossa atuação profissional.
Tecidas estas considerações preliminares, e também tendo em mente o eixo
temático do Seminário Internacional – Paulo Freire e a Educação Superior - é
importante ressaltar um importante aspecto. Ele nada mais é do que entender
quais os novos aporte e subsídios que ocorrem no pensamento de Paulo Freire para se entender como seu pensamento fertiliza e ressignifica
o meio acadêmico no século XXI, através da temática da docência em ensino
superior. Ou, em outras palavras: como encarnamos/recriamos em nossa própria
docência tanto os conceitos, princípios ou ainda fundamentos que norteiam
nossas investigações e estudos? Estamos, efetivamente, socializando o aporte
recebido e gerado em nossa prática docente? Temos aproveitado as oportunidades
e contribuído para o ambiente institucional universitário? Em última análise,
objetiva-se analisar sob a lupa freiriana a própria prática docente, no que
concerne a tão importante e inseparável relação ensino/pesquisa que tem sido
descurada e denunciada à exaustão pelo meio acadêmico. Senão vejamos:
Fala-se hoje, com insistência,
no professor pesquisador. No meu entender o que há de pesquisador no professor
não é uma qualidade ou uma forma de ser ou de atuar que se acrescente à de
ensinar. Faz parte da natureza da prática docente a indagação, a busca, a
pesquisa. O de que se precisa é que, em sua formação permanente, o professor se
perceba e se assuma, porque professor, como pesquisador (1996, p.32).
Justifica-se tal reflexão, visto que ela não diz respeito
àqueles que vivenciam o processo ensino/aprendizagem – professores e
professoras universitários – mas também àqueles que são atingidos pelas
repercussões de sua docência. Entendemos que deve, mais do que nunca, haver um
esforço para, como Paulo Freire muito bem pontuou, haver a eliminação de uma
“educação bancária” nas fases iniciais da formação acadêmica, para uma mudança
das práticas educativas em âmbito generalizante. Ou, em outras palavras, o que
queremos dizer é que o processo ensino/aprendizagem e a pesquisa em nossas
experiências universitárias são um elemento formativo insubstituível para a
fomentação e criação de um novo senso comum em torno do ato de ensinar, com o
intuito de ressignificar a expressão de que “ensinar não é transferir conhecimento, mas criar possibilidades para a sua
produção ou a sua construção” (Freire, 1996, p.25), em processos educativos que
não priorizam o conteúdo, mas sim fazem de sua práxis a centralidade dos
sujeitos e tomam como ponto de honra a superação dos aspectos
institucionais que legalizam as relações
excludentes.
Dentro de nossa instituição, que tem como fio condutor,
como já foi ventilado, a educação informal e não formal, através de ações que
valorizam o aprendizado extra-acadêmico, em vivências corriqueiras, sociais,
familiares, religiosas, em conversas de bar, ou em um simples “bate papo”,
queremos fazer um recorte e analisar como esta visão de educação, levantada e
propugnada por Dom Bosco, na Itália, e sendo ideário da Unisal, como sua
legítima herdeira, está sendo implementada no âmbito acadêmico. Não custa frisar
que esta visão de mundo bosquiana tem simetria muito forte com o pensamento
da pedagogia do oprimido de Paulo
Freire, razão pela qual optou-se em fazer este estudo dentro do eixo de
pesquisa do curso de Mestrado em Educação linha dois (02) e sua inserção
bosquiana/freiriana no contexto de Ensino Superior.
2.
DESENVOLVIMENTO
2.1
A gestação da curiosidade epistemológica enquanto elemento instigador à
formação do educador
É inquestionável que a curiosidade epistemológica, dentre
outros tópicos que perfazem os saberes necessários à prática educativa, assim
como a categoria de investigação é um iter que constitui a prática docente
crítica-reflexiva. Enquanto elemento componente da criticidade, pode-se dizer que
a curiosidade epistemológica é
a instância principal para se haver o processo ensino/aprendizagem, sendo um produto-produtora do processo de estudo
e pesquisa sobre a própria prática, dir-se-ia um questionamento sobre a
incompletude do conhecimento.
Vamos focar um
diálogo havido entre Paulo Freire e Carlos Torres, quando de seu desligamento
da Secretaria de Educação de São Paulo, no que tange à construção do
conhecimento.
Carlos Torres: (...)Qual é a
herança de Paulo Freire para nós, educadores latino-americanos e de outras
partes do mundo? (...)
Paulo Freire: Qual a herança que
posso deixar? Exatamente uma. Penso que poderá ser dito quando já não esteja no
mundo: Paulo Freire foi um homem que amou. Ele não podia compreender a vida e a
existência humana sem amor e sem a busca de conhecimento. Paulo Freire viveu,
amou e tentou saber. Por isso mesmo, foi um ser constantemente curioso. (1991,
p. 139-140)
Ecoando Aristóteles que dizia “é natural que todo homem, por natureza
deseja saber”, (Aristóteles, Metafísica, 980ª), Paulo Freire considera a curiosidade como uma necessidade
ontológica do ser humano; característica fundamental em sua busca permanente de saberes que lhe
possibilitem a criação e recriação de sua própria existência; “uma espécie de
abertura à compreensão do que se acha na órbita do ser desafiado” (Freire,
1995, p.76). Segundo Paulo Freire, essa curiosidade, ao ultrapassar os “limites que lhe são peculiares do
domínio vital, se torna fundante da produção do conhecimento” (Freire, 1996, p.61).
Todavia, essa
curiosidade e postura epistemológica, a fim de se efetivarem e cristalizarem no
ato de conhecer, devem se ligar a uma educação crítica, prenhe e fértil do ato
de transformar a realidade. Neste sentido, Freire, ao conceituar a educação como
“um ato de conhecimento, uma aproximação crítica da realidade” (Freire, 1979 a, p. 25), considera os
atos de ensinar e aprender, que caracterizam a natureza da prática educativa,
enquanto “dimensões do processo maior - o de conhecer” (1992, p.110). Dentro
desta perspectiva crítica epistemológica, propõe, em contrapartida à concepção de educação bancária, emasculadora
da curiosidade dos educandos, uma concepção
problematizadora e libertadora de educação partindo do ponto de qual seja a
capacidade de conhecer, vinculada à curiosidade em torno do objeto,
constituindo-se numa vivência permanente do “desafio à curiosidade ingênua do
educando para, com ele, partejar a criticidade” (Freire, 1995, p.79) e ir forjando a constituição da curiosidade epistemológica.
Então, para Freire, a curiosidade epistemológica é aquela que,
ao viabilizar a tomada de distância do objeto, transcende os limites do
cotidiano na qual nossa mente não opera epistemologicamente. Própria da
“consciência crítica, aquela que não se satisfaz com as aparências” (Freire, 1979 b, p.40) e busca a
compreensão dos problemas com maior profundidade, a curiosidade epistemológica não é qualquer curiosidade, mas é a
curiosidade que está ligada ao tão difícil quanto prazeroso ato de estudar.
Assim, ao destacar sua compreensão do conhecimento enquanto produção social,
considera-o resultante “da ação e reflexão, da curiosidade em constante movimento de procura” (Freire, 1993, p.
9-10). Analisa como o homem foi, ao longo de sua história, aprimorando sua
capacidade de conhecer ao aperfeiçoar seus métodos de aproximação dos objetos
para melhor compreendê-los, para ultrapassar
o nível meramente opinativo (ibid, p.11), transformando sua curiosidade ingênua numa “curiosidade exigente, metodizada com
rigor, que procura achados com maior exatidão” (ibid).
Em razão disto, existe
a preocupação com “uma prática formadora fundada no estímulo e no
desenvolvimento da curiosidade epistemológica” (Freire,1994, p.130), enfatizando
a necessidade de uma educação comprometedora em promover a travessia da curiosidade ingênua à curiosidade epistemológica, a fim de estimular, de maneira crítica, a
capacidade de aprender, assim como de
aventurar-se e arriscar-se na tarefa fundamental da inteligibilidade crítica do
mundo.
Através da superação da
curiosidade ingênua, Freire justifica
sua ansiedade com uma educação que vença a superação da curiosidade ingênua a partir
de seu entendimento de que a mesma não se dá automaticamente, mas sim “se dá na
medida em que a curiosidade ingênua, sem deixar de ser curiosidade, pelo
contrário, continuando a ser curiosidade, se criticiza” (Freire,1996, p.34). De
acordo com ele, a fim de que se dê esse processo de criticização da curiosidade, nada mais natural do que a criação e o
desenvolvimento de uma rigorosidade
metódica que amplie as possibilidades de nossas buscas epistemológicas,
pois “essa rigorosidade metódica é que faz a passagem do conhecimento ao nível
do senso comum para o do
conhecimento científico” (Freire,
1995, p.78). Entretanto, alerta-nos para que não nos deixemos levar pela “tentação
de supervalorizar a ciência e menosprezar o senso comum” (Freire, 1993, p.11).
Neste sentido, o menosprezar o saber de
experiência feito já seria uma maneira de elitizar a educação, assim como
fazer da ciência algo absolutizado.
O processo de conhecimento
transita da ingenuidade (Freire, 1996, p.32) para a criticidade, que se
constitui a curiosidade epistemológica. Uma
séria disciplina intelectual irá
sendo forjada no exercício desta rigorosidade
metódica, no sentido da vivência do significado próprio que Freire atribui
ao rigor. Para ele, trata-se de um rigor
criativo:
(...) aquele pelo qual você faz
mais do que observar - você interpreta a realidade(...)começo a notar cada vez
mais, na minha observação que o objeto não é algo em si mesmo, mas está dialeticamente
se relacionando com outros que constituem uma totalidade. (Freire, 1986, p. 104)
Tomando-se como
princípio que, sem o exercício da curiosidade
epistemológica, “deteriora-se a prática educativa progressista” (Freire,
1995, p.79), existe a preocupação com o desenvolvimento da mesma no âmbito
escolar, dizendo que este pode ser vivenciado “enquanto um contexto aberto ao
exercício da curiosidade epistemológica” (ibid.,
p.78) e ainda levando-se em conta que ele deveria ser uma “preocupação de todo
projeto educativo sério” (ibid). Tal
projeto inovador faz parte de seu sonho de reinvenção
da escola, o qual, segundo ele, não se implementará sem um grande investimento
na formação permanente de professores(as), visto que é preciso que se reinvente a escola partindo-se da base
reflexiva feita na própria escola.
Neste patamar, é
imprescindível que os meios e recursos de formação permanente na escola poderão
ser reinventados para tornarem-se espaços
privilegiados de fomento à curiosidade
epistemológica. A partir destes, intencionalmente organizados e planejados
para tanto, haverá a instauração de um diálogo sobre o ensinar e o aprender que
poderá vir a ser um caráter desafiador desta curiosidade epistemológica que impulsiona o professor na busca de
ter um papel ativo (sujeito da produção do conhecimento) para construir e poder
suplantar a superação da pedagogia da resposta por outra, ou seja, a pedagogia
da pergunta. Deste modo, poder-se-á gestar uma pedagogia da curiosidade na qual
o professor, ao vivenciar de modo permanente a curiosidade de aprender, será
provocado a recriá-la na complexa
relação com seus aprendentes.
Como consequência, o
vivenciar uma curiosidade epistemológica
no dia a dia escolar poderá ser uma oportunidade de uma possibilidade de expressão
de prazer de ensinar e aprender, visto que “quanto mais metodicamente rigoroso
me torno na minha busca e na minha docência, tanto mais alegre me sinto e
esperançoso também” (Freire, 1996, p.160). Sem dúvida, isto é um desafio a ser
superado e materializado no ambiente escolar. Também é necessário que o
educador torne possíveis de serem vivenciáveis tais possibilidades em seu
processo de formação inicial, para que possa recriá-las no cotidiano de seu
trabalho.
2.2. Aprendendo
com a própria história: o trabalho com alunas do Curso de Modas na Unisal –
campus centro – Dom Bosco de Americana/SP.
Como alunos do curso de
Mestrado em Educação pela Unisal – campus Maria Auxiliadora, Americana/SP,
tentamos buscar o entendimento do vocábulo curiosidade
epistemológica na obra de Paulo Freire, e também temos como premissa de
tomá-la como um desafio enquanto estudantes e estagiários no programa PED
(Programa de Estágio Docente) no Curso de Modas, instituído pela Mantenedora,
objetivando o aprimoramento do aluno mestrando em sua prática acadêmica futura,
assim como o inter-relacionamento com alunos (as) do curso, auxiliando o
professor a ministrar as aulas, sendo agente motivador do processo
ensino/aprendizagem. Neste sentido, um dos pontos fundamentais que objetivo
tematizar é o próprio processo formador que constrói as condições de
possibilidade visando à promoção da curiosidade
ingênua à curiosidade epistemológica, processo esse, segundo Paulo Freire, que demanda uma rigorosidade
metódica capaz de desenvolver a disciplina
intelectual necessária para tal. Esta tem sido uma preocupação que orienta
meu que fazer neste estágio PED,
assim como norteia minha carreira docente.
O professor que
ministra as aulas da disciplina Processos
Criativos, que é eletiva, Dr.
Severino Antônio Moreira Barbosa, objetiva, com ela, suscitar nos alunos (as)
do Curso de Moda a criatividade, vital para esses futuros profissionais em seu
futuro campo de trabalho.
Não há dúvida de que a partilha da reflexão fertiliza e
ressignifica o levantamento de novas questões que contribuem para superar as
dificuldades enfrentadas e ampliar as vivências de possibilidade. Assim, no
dinamismo que constitui o ato de pesquisar a própria prática, o ensino se faz
gerador de alegria. A alegria de aprender e ensinar move o ato pedagógico na
perspectiva da construção da autonomia do aluno/a e também do professor/a, num
processo mútuo e permanente de construção do conhecimento, em que a alegria não
se opõe ao rigor e à seriedade inerentes ao ato crítico de estudar.
Pelo contrário, quanto mais
metodicamente rigoroso me torno na minha busca e na minha docência, tanto mais
alegre me sinto e esperançoso também. A alegria não chega apenas no encontro do
achado mas faz parte do processo da busca. E ensinar e aprender não podem
dar-se fora da procura, fora da boniteza e da alegria (Freire, 1996, p.160).
Temos um desafio que
nos tem acompanhado no trabalho docente de formação de professor, e também como
Mestrandos em Educação, ou seja: estabelecer uma relação pedagógica na qual se
descubra o prazer de aprender, em que se vivencie uma nova relação subjetiva
com a leitura e a escrita enquanto atos inerentes ao exercício crítico da
reflexão sobre a prática profissional da docência. É esse o entendimento que
nos leva a iniciar cada novo semestre tomando o desenvolvimento da curiosidade epistemológica como uma meta
que orienta a organização do contrato didático a ser estabelecido com novas
turmas, em especial esta de Curso de Modas na qual temos exercido o estágio
PED.
Como viabilizar um contrato didático comprometido
com uma concepção libertadora da educação? Eis uma preocupação que nos tem orientado a
proposição de diversos movimentos dos quais resultaram o estabelecimento de
quatro compromissos fundamentais que hoje são ponto de partida para a organização
do trabalho com cada turma do curso de Modas na Unisal, por parte do professor
Severino, ao iniciar um semestre letivo: o compromisso
com o coletivo, que inclui a presença e a participação, entre outros; o compromisso com a reflexão, que diz
respeito ao envolvimento nas discussões, anotações em processo, etc; o compromisso com a leitura/escrita na
realização das leituras indicadas e entrega de trabalhos; e o compromisso com a construção de conceitos
(novos) a partir dos eixos temáticos trabalhados.
Quais as possibilidades de criar, no âmbito da
formação inicial, instrumentos metodológicos que potencializem a necessária
vivência da curiosidade epistemológica para que o professor se assuma como
sujeito da práxis educativa libertadora? Desta
inquietação nasceu e vem se desenvolvendo o trabalho através de relatórios que
estamos fazendo quanto à participação dos alunos (as) nas aulas do professor
Dr. Severino Antônio Moreira Barbosa.
A bem da verdade, a curiosidade epistemológica enquanto
práxis educativa libertadora, no curso de educação superior de Modas na Unisal
foi estabelecida aos poucos pelo condutor do processo pedagógico. A princípio
os alunos (as) eram arredios (as) à ideia de uma disciplina eletiva, e ainda
mais que se trabalhava com conceitos tais como: retratar através de metáforas a realidade, evocar imagens de infância,
comparações originais, estranhamento do objeto da natureza ou de produtos
humanos. Entrementes, com a curiosidade epistemológica, os alunos conseguiram
suplantar a fase de fastídio e desdém pela disciplina e começaram a se envolver
no processo de aprendizagem. Isto através do uso de questionamentos críticos, tomando
por base a curiosidade epistemológica, e depois visando despertar a práxis
educativa libertadora.
Também merece destaque
a reflexão em torno do modo como o trabalho com os relatórios de aulas
assistidas, possibilita a vivência positiva da tensão entre a obrigatoriedade e
a autonomia, na perspectiva proposta por Snyders (1993) de que “as obrigações
escolares podem levar os alunos a uma independência que torna quase
insignificante a liberdade que eles pensam encontrar quando fazem muito
simplesmente tudo de que têm vontade na hora” (p.114). A obrigatoriedade de
fazê-los tem sido condicionada à escolha de cada um/a sobre quando fazê-lo, bem
como à forma própria de sua elaboração.
Neste diapasão, a
escrita, o diálogo e a curiosidade vão sendo assumidos como compromissos
individuais e coletivos, à medida que, tanto cada um/a vai exercitando-se em
sua própria forma de pensar, de ter uma curiosidade
epistemológica. A obrigatoriedade da escrita, assim como o de pensar novas
formas de processos criativos, vai cumprindo sua função educativa. Sobretudo, é
possível perceber descobrir novas formas criativas, objetivo último da
disciplina, faz pensar, dá trabalho, requer tempo e dedicação, mas vem-se
constituindo como importante instrumento metodológico na perspectiva do
desenvolvimento da curiosidade
epistemológica.
3.
Da intenção à vivência, significados em construção e fertilizadores no meio
acadêmico - Curso de Moda da Unisal – segundo conceito de Paulo Freire e Dom
Bosco.
Esta experiência do PED (exigência
do Curso de Mestrado em Educação) junto ao curso de Modas da Unisal trouxe-nos aportes preciosos quanto ao nosso
fazer e saberes acadêmicos. Especialmente porque pudemos constatar in loco a importância do pensamento
freiriano da curiosidade epistemológica e a práxis educativa libertadora.
Como já foi dito, a turma sendo
heterogênea, havia poucas pessoas interessadas na disciplina processos
criativos. Para ser bem franco, não havia curiosidade epistemológica
alguma, pelo horário desta aula (das 21h00 às 22h50) e também por taxá-la como
desnecessária e inútil. Entrementes, o professor titular conseguiu, com propriedade, utilizando-se dos
conceitos de educação libertadora, construção conjunta de conhecimento e
curiosidade em conhecer, incitar o gosto por este estudo que é fulcral e
necessário a futuros profissionais da moda que devem ter uma mente aberta a
novas criações.
O diálogo sempre foi utilizado como
instrumento de iniciação das aulas, com respeito às opiniões contrárias, mesmo
daqueles que não queriam assistir às aulas, reputando-as de desnecessárias e
não úteis à futura formação profissional. Aliado ao diálogo, o questionamento e
o direito de voz e de vez aos alunos foi outra constante nas observações das
aulas. Havia o direito de se posicionar, o que era estranho para estes alunos,
pois sempre foram coagidos a aceitar a opinião alheia sem questionamento. Este
direito de posicionamento, do respeito à alteridade é uma característica da
educação sociocomunitária de extrato de Dom Bosco.
A criticidade foi outro
aspecto trabalhado muito nestas aulas com os alunos. Uma educação crítica, não
imposta de cima para baixo, mas que questiona, que sopesa os lados,
conscientizadora, especialmente nos aspectos de Moda, de pessoas que ditarão
tendências a serem seguidas, que poderão impor ditaduras de costume, deve ser
entendida como, segundo o pensamento de Paulo Freire, Ninguém
conscientiza ninguém; Ninguém se conscientiza sozinho; Os homens e as mulheres
se conscientizam em comunhão (Freitas, 2001).
4. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Seria
interessante relatar, ao final deste trabalho, o ocorrido em uma aula com os alunos
(as) no curso de Modas em nível superior da Unisal. O objetivo da aula era o
despertar a motivação da criatividade de uma turma através de uma exposição
crítica levada a cabo pelos autores deste paper
da Escola de Design Bauhaus que teve seu apogeu entre 1919 e 1933
na Alemanha. Houve uma informação prévia sobre a necessidade crescente de fazer
crescer este saber e que o assunto seria abordado em uma aula posterior. Ou, em
outras palavras, tentou-se fomentar a curiosidade
epistemológica preconizada por Paulo Freire, para, num segundo momento,
despertar a pedagogia educacional da
práxis libertadora.
Devido à
alienação crescente na sociedade, que se reflete no meio acadêmico, não houve
este despertar da curiosidade. Todavia, quando os slides do power point, aliados com nossa exposição
e incremento de perguntas foram sendo apresentados, notou-se um interesse que
nos surpreendeu muito. Após alguns minutos de exposição, a turma foi tomada de
um certo êxtase pelo assunto, fazendo-nos ressignificar nossos saberes
acadêmicos sobre o assunto. Houve questionamentos que até aquele momento não
imaginávamos que ocorressem, ou seja, conseguiu-se despertar o questionamento,
base de nossa carreira acadêmica, a criticidade. Através desta última
qualidade, os alunos conseguiram compreender o período, assim como as
implicações socioeconômicas e políticas desta escola para a Alemanha e para o
mundo ocidental.
Pediu-se,
posteriormente, um relatório para os (as) alunos, a fim de se aferir o quanto
aquele momento de construção conjunto de saberes tinha representado para eles.
Relato
de uma prática ineditamente-viável
Sem
dúvida, no decorrer desta troca de saberes entre os estagiários e as alunas do
Curso de Modas da Unisal, houve o que Freire denomina “ensinar exige saber escutar”.
Constatamos isto claramente através dos relatórios solicitados após a aula,
para aferir o quanto tínhamos conseguido adentrar na pedagogia preconizada por
Freire. Os relatos eram cheios de alegria e agradecimento por termos
proporcionado este momento de descontração e de saberes a eles. Não imaginavam
que este período histórico poderia agregar tanto conhecimento disciplinar a seu
saber/fazer cotidiano. Já tinham ouvido fazer vagamente nesta escola, mas sem
NUNCA atentar em estudá-lo com mais afinco. Não há dúvida de que, atualmente,
estes dados objeto de estudo na aula, estão disponibilizados na internet, mas não são acessados ou
lidos. Bastou que nós motivássemos os alunos (curiosidade epistemológica) para que houvesse esta devolutiva
através dos relatórios. No final do mês, houve uma devolutiva muito
interessante por parte de uma aluna deste curso, que nos deixou muito contentes
e motivados na construção de saberes e certos de que a pedagogia libertadora
preconizada por Paulo Freire, é prenhe de significados e resultados.
Trata-se
de um cartão recebido juntamente com o relatório de avaliação da aula assistida,
com os seguintes dizeres: (...) me fez
refletir e rever alguns conceitos em mim enraizados há muito tempo. Sabe aquele
“friozinho no estômago”, ao finalizar algo, ou melhor, entregar um depoimento
pessoal? É a mesma sensação: A
seguir vinha uma fotografia de nosso último encontro, em sala de aula com o
professor e nós, estagiários em um momento de confraternização. Após a foto,
seguiam suas palavras: Insegurança, medo,
receio que não está correto. Porém, é maravilhoso quando chegamos do outro
lado, quando conseguimos superar os obstáculos, quando confiamos em nós mesmo,
podendo exprimir o que sabemos e compartilhar saberes.
É
inquestionável que conseguimos despertar o interesse pelo conhecimento nestes
alunos (as), que, a princípio refratários a ele, se tornaram interessados em
sua libertação. Não houve uma educação
bancária, alvo de críticas acerbas de Paulo Freire, mas sim um despertar,
um ressignificar do ato de aprender, através do respeito pela alteridade, pela
indiferença, poder-se-ia dizer dos aprendentes. Como a Unisal, dentro da
filosofia da educação sociocomunitária, conjugada com a filosofia de freiriana,
tão bem consegue materializar, conseguiu-se fertilizar o meio acadêmico de um
curso de Modas usando-se conceitos de Paulo Freire – curiosidade epistemológica – e o Dom Bosco, - proporcionar subsídios que favoreçam a
construção da autonomia e a transformação social.
5.
Referências bibliográficas
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Teoria e prática da libertação - uma introdução ao pensamento de Paulo Freire.
São Paulo: Cortez & Moraes, 1979a
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______.
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Disciplina: Processos Criativos, Curso de Modas, Unisal – Unidade Dom
Bosco/Centro/Americana.
SNYDERS, Georges. Alunos Felizes: Reflexão sobre a alegria na escola a partir de
textos literários. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1993.
_________________. Escola, classe e luta de classes. Lisboa: Moraes Editores, 1997,
2ª. edição.